A Americanas marcou para esta quinta-feira (16) uma reunião com bancos e credores financeiros em São Paulo, na tentativa de avançar em acordos para apresentar um plano de recuperação judicial, a qual aderiu no último dia 19, declarando dívidas de R$ 43 bilhões.
 

"A Rothschild & Co realizará reuniões de trabalho com bancos e credores financeiros nesta quinta-feira para avançar no desenho de um acordo", informou a varejista, em nota. A Rothschild foi contratada pelo comando da Americanas como interlocutora na renegociação da sua dívida, no Brasil e no exterior. A tarefa está a cargo de Luiz Muniz, sócio do banco de investimentos no Brasil.
 

Muniz é próximo do trio de bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira, controladores da Americanas até o final de 2021 e, atualmente, acionistas de referência da varejista, onde somam uma participação de 31%.
 

Quem também estará na reunião é o carioca Roberto Thompson Motta, sócio dos bilionários na empresa de private equity 3G Capital. A presença dele é fundamental para o comando da Americanas tentar avançar na negociação com os credores.
 

A Folha de S.Paulo apurou junto a fontes próximas aos bancos que estas reuniões têm acontecido com alguma frequência -uma delas foi na semana passada, por exemplo. O grande objetivo desses encontros é discutir o valor que os acionistas de referência vão aportar no negócio. Daí a importância de Roberto Thompson.
 

Além de próximo dos maiores acionistas, os quais conhece desde 1986, quando foi trabalhar no banco Garantia (que pertencia a Lemann), Thompson também teve posição relevante na Americanas, onde dava a última palavra na área financeira, e participou por décadas do conselho de administração e de comitês internos.
 

Segundo uma fonte que trabalhou próxima ao executivo nesta época, Thompson respondia por todas as operações que envolviam bancos -contratação, definição das taxas etc. Mas não foi só por causa do seu histórico na varejista que o executivo foi escolhido para representar o trio de bilionários na dura mesa de negociações.
 

"Quem já esteve ao seu lado em uma reunião diz que Thompson é um sujeito educado, frio e pragmático, que raramente sorri ou eleva o tom de voz -um trunfo notável nas guerras de nervos em que essas grandes negociações normalmente se transformam", relata a jornalista Cristiane Correa no livro "Sonho Grande" (editora Sextante, 2013), que narra a história do trio Lemann, Telles e Sicupira.
 

Este último foi o grande responsável pela condução da Americanas desde que a varejista foi comprada pelo Garantia, em 1982. Conforme a Folha de S.Paulo apurou, dependiam de Beto Sicupira as decisões tomadas por Miguel Gutierrez, que nos últimos 20 anos foi o presidente da Americanas, onde acumulou também o cargo de diretor de relações com investidores.
 

Bancos precisam aprovar o plano ou Americanas entra em falência Para que o plano de recuperação judicial seja apresentado à Justiça em 19 de março, a Americanas precisa entrar em acordo com os grandes credores, que se mostram extremamente insatisfeitos com as soluções "paliativas" que o trio de bilionários têm apresentado -como o financiamento DIP (do inglês debtor-in-possesion financing, ou "financiamento do devedor em posse"), aprovado pela Justiça no último dia 9, no valor de até R$ 2 bilhões.
 

Segundo uma fonte que acompanha a negociação, os bancos consideraram o valor proposto "risível", diante do montante da dívida, que veio a público depois que o ex-presidente da Americanas, Sérgio Rial, revelou "inconsistências contábeis" de R$ 20 bilhões no balanço da varejista, ao longo dos últimos anos.
 

Para os bancos, não há dúvidas que houve fraude contábil para inflar os balanços da Americanas.
 

As instituições financeiras consideram que, da forma como foi proposto (em segredo de Justiça), o financiamento parece uma forma de os acionistas aportarem dinheiro às custas dos credores. Para os bancos, os acionistas devem aportar capital na Americanas e não propor um empréstimo.
 

A maior dívida da varejista está nas mãos dos bancos privados. Os débitos com as instituições financeiras somam quase R$ 20 bilhões, sendo o Bradesco o maior credor (R$ 5,1 bilhões), seguido por Santander (R$ 3,6 bilhões), BTG (R$ 3,5 bilhões), Itaú Unibanco (R$ 2,7 bilhões) e Safra (R$ 2,5 bilhões). Também estão na lista os bancos públicos Banco do Brasil (R$ 1,6 bilhão) e Caixa (R$ 500 milhões).
 

Os bancos discutem se a dívida bilionária será transformada, por exemplo, em participação societária na Americanas, a fim de aliviar o caixa e permitir o cumprimento do plano de recuperação judicial sem grandes sobressaltos, informou uma fonte que acompanha a negociação.
 

Se os bancos não aprovarem o plano, o caminho que resta à Americanas é a falência -uma solução que não é boa para ninguém, incluindo as instituições financeiras.