Foto: Aldo Dias / TST
Penduricalhos garantiram a ministros do TST (Tribunal
Superior do Trabalho) rendimentos líquidos de até R$ 419 mil em dezembro,
segundo dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
Embora os pagamentos de verbas extras a magistrados tenham
alcançado valores vultuosos em diferentes instâncias do Judiciário pelo país,
os valores recebidos na corte trabalhista se destacam entre os tribunais
superiores -e com benefícios que se estendem a quase todos os seus integrantes.
Dos 27 ministros do TST, 26 receberam em dezembro uma
remuneração acima de R$ 250 mil líquidos. A média por magistrado, já com os
descontos, chegou a R$ 357 mil -em valores brutos, R$ 514 mil.
O cálculo inclui salário fixo (remuneração fixa e mensal de
magistrados, que não chega a R$ 42 mil), pagamentos retroativos e benefícios
como abonos e auxílios, após os descontos de previdência, Imposto de Renda e
retenção pelo teto constitucional (correspondente a R$ 44 mil).
Os dados relativos à folha de pagamento constam em painel
mantido pelo CNJ com base em informações disponibilizadas pelos próprios
tribunais.
Quem liderou o ranking pelo rendimento líquido no período foi
o ministro Sergio Pinto Martins, que obteve R$ 419 mil livres (ou R$ 533 mil
brutos). Já com base no rendimento bruto foi o vice-presidente da corte,
Mauricio Godinho Delgado (R$ 394 mil líquidos e pouco mais de R$ 706 mil
brutos).
A exceção no TST que não obteve ganhos livres na faixa das
centenas de milhares de reais foi Antônio Fabrício de Matos Gonçalves.
Empossado em julho de 2024, ele embolsou R$ 102 mil brutos e R$ 83 mil líquidos
em dezembro.
No STJ (Superior Tribunal de Justiça), a remuneração de maior
valor de um ministro no período foi de R$ 119 mil líquidos. De acordo com dados
do painel, a média de dezembro entre os magistrados da corte ficou em R$ 88
mil. Já no STM (Superior Tribunal Militar), a maior quantia chegou a R$ 318 mil
-e a média, R$ 286 mil.
O STM diz que a remuneração dos ministros ficou acima do
vencimento mensal normal em razão de pagamentos de indenizações de exercícios
anteriores.
Foram pagos valores relativos a, por exemplo, adiantamento de
gratificação natalina, remuneração antecipada de férias e terço constitucional
de férias, além de direitos eventuais, incluindo licença compensatória,
gratificação por exercício cumulativo de jurisdição e verbas de exercícios
anteriores.
Procurado, o STJ disse que não se manifestará sobre o tema.
As verbas dos ministros do TST foram incrementadas por
rubricas sob o guarda-chuva de "direitos eventuais", entre elas abono
constitucional de um terço de férias, antecipação de férias e gratificação
natalina.
Mas, em geral, nenhuma foi maior que a dos pagamentos
retroativos. A soma que compõe a remuneração bruta do ministro Delgado, antes
dos descontos, bateu R$ 536 mil. No caso de Pinto Martins, atingiu R$ 366 mil.
De acordo com o TST, o pagamento dos valores retroativos
foram previamente autorizados pelo CNJ em procedimentos relativos ao
quinquênio, ou ATS (Adicional por Tempo de Serviço), e à licença compensatória.
O quinquênio prevê um adicional de 5% a cada cinco anos de
serviço até o limite de 35%. A licença compensatória autoriza a conversão de
dias de folga em dinheiro. Os dois são penduricalhos do Poder Judiciário.
A remuneração básica de um ministro do TST corresponde a 95%
do que recebe um ministro do STF, o teto do funcionalismo público, mas os
valores podem ultrapassá-lo.
Verbas de natureza indenizatória, como a licença
compensatória, não entram no cálculo do teto. O quinquênio, por ter natureza
remuneratória, está sujeito a ele, mas contribui para inflar os rendimentos,
considerado o limite.
A corte disse que os valores "são considerados na conta
do teto constitucional quando possuírem natureza remuneratória, sendo que o
cotejo com o teto constitucional é observado tendo por referência a competência
a que se referir a parcela objeto do pagamento".
O CNJ não respondeu se queria se posicionar quanto a decisões
que permitem ganhos acima do teto.
A diretora-executiva da ONG Transparência Brasil, Juliana
Sakai, diz que aprovar pagamentos como o da licença compensatória é um
"completo descalabro" que poderia até contrariar a Lei de
Responsabilidade Fiscal.
"Ficamos em um beco sem saída", diz ela. "O
Judiciário, que deveria prezar pela legalidade, se usa de uma série de
mecanismos para desafiar o que está dito na Constituição, para desafiar o teto
constitucional."
"E são eles mesmos que interpretam a lei", continua
Sakai. "O que vamos fazer se os responsáveis pela defesa da lei estão
fazendo esse serviço a seu próprio favor corporativista?."
Um relatório de dezembro da Transparência Brasil indicou que
a licença compensatória custou R$ 819 milhões à Justiça entre julho de 2023,
quando o benefício começou a ser pago em maior escala, e outubro de 2024.
O economista André Perfeito diz que penduricalhos dão a
impressão de que "o Brasil é país do puxadinho" e de que não há
clareza sobre a máquina pública. Além disso, para ele, essas remunerações criam
distorções na economia.
"O Judiciário tem que entrar na discussão sobre gastos
do Estado", afirma ele. "Se o objetivo do Judiciário é trazer mais
justiça, talvez ele tenha que cortar. A eficácia de reais por justiça social
tem que ser melhor balanceada."
Felippe Angeli, advogado e coordenador de advocacy da
Plataforma Justa, evita qualificar se os penduricalhos e a remuneração dos
magistrados são razoáveis ou mesmo justificáveis diante das funções
desempenhadas por eles.
Afirma que o debate deve se concentrar no descumprimento do
teto e critica o conflito de interesse na aprovação de penduricalhos pelo
próprio Judiciário. Diz que, se os adicionais servem para burlar o teto,
deveria haver um limite específico para eles.
No direito, existe uma expressão chamada fumus boni iuris
(fumaça do bom direito), lembra Angeli. Do jeito que está, diz ele, "não
vejo fumaça do bom direito, não vejo valor constitucional, não vejo
justiça".
Por Bahia Notícias