Foto: Gil Ferreira / Ag. CNJ
Duas resoluções aprovadas pelo
CNJ (Conselho Nacional de Justiça) em dezembro estabelecem regras que buscam
ampliar a presença de mulheres no Judiciário e garantir a aplicação das cotas
raciais.
As iniciativas se somam a outras
medidas de incentivo à diversidade aprovadas pelo órgão ao longo de 2023 e que
também passam a valer neste ano.
Em setembro, ainda sob a
presidência da ministra Rosa Weber, o CNJ instituiu a alternância de gênero em
promoções por merecimento de juízes de carreira na Justiça estadual, federal e
do trabalho. A ação afirmativa deverá ser adotada a partir deste mês nas cortes
em que houver menos de 40% de juízas de carreira no segundo grau.
Já na sessão de 12 de dezembro,
o conselho aprovou outra mudança para que a paridade de gênero também seja
adotada nas atividades administrativas dos tribunais.
A nova resolução altera a
política de incentivo à participação institucional de mulheres no Judiciário
para determinar que os tribunais tenham, no mínimo, 50% de mulheres –o que
inclui mulheres transexuais e de gênero fluído– nessas funções.
A regra vale para designações de
juízes como auxiliares, preenchimento de cargos de chefia, assessoramento e
mesmo de direção, quando forem de livre indicação. Também deve ser aplicada na
composição de colegiados, mesas de eventos institucionais e na contratação de
estagiários e de empresas prestadoras de serviços terceirizados.
Em seu voto, a relatora da ação,
a então conselheira Salise Sanchonete, destacou que a subrepresentação feminina
"demanda a implementação de políticas públicas verdadeiramente eficazes e
transformadoras, já que o simples decurso do tempo tem se mostrado insuficiente
para equilibrar essas desigualdades".
A juíza auxiliar da presidência
do CNJ Karen Luise de Souza afirma que a nova regra é um avanço na política de
incentivo à participação feminina em posições de liderança e gestão.
"É um passo significativo
para atingir a igualdade de gênero e a representatividade feminina em espaços
tradicionalmente ocupados por homens, promovendo justiça, equidade e
enriquecendo o processo de tomadas de decisões", diz.
Sanchonete afirma que, ao
contrário da regra de gênero para promoções, a mudança não enfrentou
resistência.
O presidente do CNJ, ministro
Luís Roberto Barroso, dialogou com as cortes para chegar a um consenso para
aprovação da regra, que passa a valer em março.
Com isso, tribunais que mudam de
presidência no início deste ano, caso do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São
Paulo) e do TJ-RS (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul), por exemplo, não
serão afetados de imediato.
A resolução dá ainda parâmetros
para o banco de dados do CNJ para seleção de mulheres com experiência no
Judiciário e na academia. A inscrição é voluntária e as cortes também podem
criar sistemas próprios.
Outra resolução, aprovada na
última sessão do conselho em 2023, estabelece regras para a criação de
comissões de heteroidentificação em concursos públicos do Judiciário.
Em novembro, o CNJ aprovou um
novo exame nacional para ingresso na magistratura. Negros e indígenas terão uma
nota de corte diferenciada de 50%, enquanto os demais concorrentes deverão
acertar ao menos 70% das questões da prova. Os cotistas deverão passar por
comissão de heteroidentificação do Tribunal de Justiça do estado de seu
domicílio antes do exame.
A normativa aprovada agora passa
a valer em abril e estabelece os parâmetros para o funcionamento dessas
comissões e de demais concursos.
Os grupos serão compostos por
cinco integrantes com maioria negra. Entre os requisitos está a formação em um
curso sobre relações raciais e enfrentamento ao racismo. A resolução também
cria um banco de dados para cadastramento de profissionais interessados em
compor as bancas.
O procedimento de
heteroidentificação levará em conta o fenótipo dos candidatos, observando
cabelo, tom de pele, nariz e boca.
Na primeira etapa, isso será
feito por meio de fotos coletadas no momento da inscrição no concurso.
Candidatos cuja autodeclaração
não for confirmada serão convocados para a segunda etapa, com verificação
presencial ou telepresencial. Aqueles que não comparecerem ou forem reprovados
perderão o direito às cotas, mas poderão disputar as vagas de ampla concorrência.
"A resolução é um passo
importante para a consolidação e aprimoramento da política de cotas", diz
a secretária-geral do CNJ, Adriana Cruz, para quem o texto é resultado do
diálogo com a sociedade civil.
Como a Folha mostrou, só 2 em
cada 5 vagas para negros foram preenchidas na Justiça estadual e nenhuma na
federal em concursos concluídos desde junho de 2015, quando o CNJ aprovou a
reserva de ao menos 20% das vagas para candidatos autodeclarados negros.
Para especialistas ouvidos pelo
jornal, as ações afirmativas criadas no novo exame nacional são necessárias,
mas o formato da avaliação precisará ser revisto para que o número de negros e
indígenas aprovados aumente.
ENTENDA AS RESOLUÇÕES APROVADAS
PELO CNJ PARA DIVERSIDADE:
- Alternância de gênero:
aprovada em setembro, a resolução estabelece que tribunais com menos de 40% de
juízas de carreira no segundo grau deverão adotar, de modo alternado, listas
exclusivas de mulheres para vagas pelo critério de merecimento até que o percentual
seja atingido. A regra passa a valer a partir de janeiro.
- Exame nacional: em novembro,
foi aprovada a criação de uma prova nacional de caráter eliminatório como um
pré-requisito para candidatos a concurso da magistratura. O exame terá 50
questões e será aplicado anualmente. Candidatos negros e indígenas serão
aprovados com 50% de acertos na prova. Para os demais, a nota de corte será de
70%.
- Cota para funções
administrativas: em dezembro, outra resolução do CNJ instituiu que tribunais
deverão destinar a mulheres 50% das vagas de funções administrativas, o que
abrange vagas para juízes auxiliares, cargos de chefia, estágio e participação
em mesas de eventos. A medida deve ser adotada a partir de março.
- Bancas de heteroidentificação:
também em dezembro foi aprovada a resolução que estabelece os parâmetros para
composição e funcionamento das bancas de heteroidentificação nos tribunais para
aplicação de cotas raciais. A normativa passa a valer em abril.