Reportagem publicada originalmente no Jornal da Metropole em 8 de setembro de 2022
O Censo 2022 foi anunciado como o retorno de um grande passo para conhecer um novo Brasil e suas 27 unidades federativas. O que milhares de recenseadores, no entanto, têm reclamado é de um velho país: com condições precárias de trabalho e episódios de desrespeito, assédio e racismo.
Na última quinta-feira (1º), recenseadores de todo o país fizeram uma paralisação, reivindicando uma reavaliação das condições de pagamento, a regularização dos atrasados e ainda uma maior divulgação do Censo, a fim de garantir segurança para os profissionais. No mesmo dia, o grupo de recenseadores da Bahia decretou uma greve de três dias.
Representante do grupo União dos Recenseadores, Lucas Ferreira conta que pelo menos 15% das reclamações desses profissionais estão relacionadas à hostilidade e assédio por parte da população baiana. De acordo com ele, episódios de racismo e até uma tentativa de estupro já foram registrados em Salvador.
No final de agosto, um caso semelhante ganhou repercussão no país: uma recenseadora foi vítima de uma tentativa de estupro na zona rural de Rondônia. No boletim de ocorrência, a mulher relatou que, após responder o questionário do Censo, o homem a abordou com uma faca e tentou forçar uma relação sexual. A recenseadora teve escoriações leves, mas conseguiu fugir.
Já em Minas Gerais, um recenseador foi vítima de uma situação que pode configurar injúria racial. Após diversas tentativas de entrevistar moradores de um prédio, ele deixou que uma foto sua fosse enviada para o grupo do condomínio, o apresentando como recenseador. A infeliz surpresa veio no comentário de uma moradora: “o rapaz tinha pinta de assaltante”, escreveu a mulher.
Apesar dos episódios de hostilidade e insegurança, a principal reclamação dos recenseadores baianos está relacionada aos pagamentos. De acordo com o representante do grupo, na última semana, foi enviada à superintendência do IBGE no estado uma lista com cerca de 700 nomes que reivindicam regularização das ajudas de custo e dos rendimentos. Ferreira alerta, no entanto, que esse número pode ser muito maior.
Ele é um dos recenseadores que está com pagamentos atrasados. Após 10 dias de trabalho sem receber o auxílio transporte, Ferreira decidiu parar de ir às ruas. “Até então, eu estava pagando para ir para a rua trabalhar. E a previsão para receber pela produtividade era só 20 dias depois de fechar o setor. Como o meu setor era muito grande, eu ainda ia trabalhar muito tempo sem receber”, conta.
De acordo com o IBGE, 1.341 recenseadores já se desligaram do cargo no estado. Os motivos, no entanto, não são informados no momento do desligamento. O instituto considera o total dentro do esperado para o momento, quando 59,8% dos domicílios baianos já foram visitados.
Quanto às reivindicações dos recenseadores, a superintendência do IBGE na Bahia declarou que está atenta e aberta ao diálogo. O instituto reconhece o atraso para cerca de 200 pessoas, motivado por problemas de documentação ou dados bancários. O IBGE declara também que está empenhado em sanar as pendências e realizar os pagamentos.