Em uma
tentativa de acalmar o mercado financeiro, o Tesouro Nacional anunciou a compra
e a venda de títulos públicos nesta semana. Serão três dias de leilões (18, 19
e 20 de dezembro), cujas condições das ofertas serão divulgadas nos dias de
realização.
Para
realizar essas operações, o órgão cancelou o leilão tradicional de títulos
previsto para esta quinta (19), comunicou o órgão após o encerramento das
negociações de mercado desta terça (17).
Segundo o
Tesouro, o objetivo da atuação é oferecer suporte ao mercado de títulos
públicos, assegurando seu bom funcionamento e o de mercados correlatos. A
atuação foi discutida com o Banco Central e se soma aos leilões de dólar
promovidos pela autoridade monetária.
Depois das
intervenções no câmbio, uma parcela do mercado financeiro passou a pressionar o
Tesouro Nacional a fazer leilões extraordinários de recompra de títulos
públicos para enfrentar o estresse do mercado em meio à disparada do dólar.
Esse tipo de
leilão funciona como uma espécie de "porta de saída" para os
detentores de títulos prefixados (com taxa definida na compra do papel) para
estancar as perdas de fundos de investimento e tesourarias.
"A tese
de parte do mercado é que o estresse do câmbio é em função da compra de dólares
por quem tinha muitos títulos do Tesouro e está perdendo dinheiro. É uma tese
plausível, mas não dá para saber se é verdadeira", diz Alexandre
Schwartsman, ex-diretor do Banco Central e consultor da A.C. Pastore.
O Tesouro
pode fazer leilão de recompra pura ou de troca, quando adquire títulos dos
investidores e simultaneamente vende os papéis, garantindo novos parâmetros de
preços para os ativos do Tesouro.
A pressão
aumentou depois que o Tesouro vendeu no leilão de desta terça títulos atrelados
ao IPCA (NTN-B) com taxas acima de 8%, o maior nível desde junho de 2008, ano
da crise financeira global.
Ao fim do
pregão, porém, a taxa de retorno estava a 7,74% no título com vencimento em
2029.
No início
deste ano, os títulos prefixados, conhecidos como LTN, pagavam cerca de 10% ao
ano. Atualmente, ativos semelhantes oferecem uma remuneração bem maior. O papel
com vencimento em 2027 encerrou o pregão desta terça a 15,48% ao ano. Essa taxa
reflete a expectativa de alta da Selic nos próximos anos por parte do mercado.
O juro futuro para 2026 encerrou a sessão a 15,14%.
Títulos do
tesouro têm um valor de resgate predeterminado. O que varia diariamente é a
taxa de remuneração e seu valor de compra, de maneira inversamente
proporcional, acompanhando os juros futuros. Quanto maior a remuneração, menor
o valor do papel, e vice-versa.
Dessa forma,
o Tesouro poderia recomprar agora títulos com um preço menor daquele de venda.
Por outro lado, teria que emitir mais títulos atrelados à Selic (LTF) para
financiar a dívida pública. Segundo economistas, isso pioraria o perfil da
dívida, que teria uma parcela maior sob efeito das mudanças de juros e uma
menor sob juros prefixados.
"Se o
mercado se acalma, o Tesouro recoloca a LTN que comprou a 15% por 12% no
mercado, mas o objetivo do Tesouro não é ganhar dinheiro", diz
Schwartsman.
Relatório
divulgado nesta quarta mostra também que, em fevereiro, a dívida pública
federal cresceu 1,2%, atingindo R$ 4,28 trilhões em fevereiro, patamar mais
alto da série.
Dado o
estresse no mercado local, muitos agentes do mercado estranharam a falta de
recompra de títulos por parte do Tesouro Nacional. Em março de 2020, com o
pânico dos investidores em torno do coronavírus, a entidade fez uma recompra de
R$ 35,6 bilhões em títulos, a sua maior atuação na história, para dar maior
liquidez às instituições financeiras.
Porém, a
necessidade de um leilão do Tesouro divide opiniões.
Os
defensores da medida dentro e fora do governo avaliam que o comportamento do
dólar e do DI futuro de longo prazo contaminou a curva de juros e tornou o
mercado disfuncional -jargão usado no mercado financeiro para situações em que
não se consegue encontrar preço para os ativos. Com a recompra, o Tesouro dá a
oportunidade aos investidores que queriam se desfazer dos seus papéis, mas não
encontravam compradores, reduzindo a demanda por dólares. Dessa forma, os
apoiadores da medida consideram que a ação deve ser conjunta com o Banco
Central.
Já quem é
contrário à medida alerta que os preços dos ativos estariam refletindo a
realidade do quadro fiscal e que uma recompra não surtiria efeito nos
indicadores.
Há também
dúvidas se a demanda pelos leilões de recompra é realmente forte ou de apenas
uma ou outra instituição financeira que esteja com maior dificuldade.
"Fazendo
um paralelo com as intervenções cambiais do BC neste momento, a eficácia de
leilões de recompra pelo Tesouro fica limitada porque a piora dos mercados não
decorre de uma disfuncionalidade temporária, mas do agravamento dos riscos
fiscais", avalia o estrategista-chefe da Warren Investimentos, Sérgio
Goldenstein, que já chefiou o Demab (Departamento de Mercado Aberto) do BC.
Segundo ele,
o Tesouro pode até fazer leilões de recompra se avaliar que o mercado de
títulos perdeu os parâmetros e ficou disfuncional, e com uma volatilidade
exagerada. O especialista ressalta, no entanto, que, como o Tesouro já vem
enfrentando há um bom tempo dificuldades para vender títulos prefixados e as
NTN-B, um volume maior de recompra alimentaria os temores de uma redução mais
acelerada do colchão de liquidez (volume de recursos que tem em caixa para
pagar os títulos que vencem) do Tesouro. Esse volume ainda está em patamar
confortável, mas tende a cair com os vencimentos elevados nos primeiros meses
de 2025.
O momento
atual está sendo comparado ao experimentado em setembro de 2015, durante o
governo Dilma Rousseff. O presidente do BC na época, Alexandre Tombini, acertou
com o então ministro da Fazenda, Joaquim Levy, uma bateria de leilões diários
do Tesouro de compra e venda de títulos.
Por Bahia
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