Foto: Marcelo Camargo / EBC
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) espera poupar R$
18 bilhões com a revisão de benefícios da Previdência e da assistência social
em 2025. O Executivo ainda prevê um corte de R$ 2,3 bilhões nos recursos do
Bolsa Família para o ano que vem.
Os valores foram anunciados pelo governo em entrevista
coletiva na manhã desta quarta-feira (28) para detalhar o programa de revisão
de gastos, que ganhou um slogan: "Revisar para repriorizar".
"Não é um 'revisaço' que acontece por um voluntarismo do
governante. É um processo sistemático, contínuo de revisão", disse o
secretário de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas do Ministério do
Planejamento, Sérgio Firpo.
A maior economia (R$ 7,3 bilhões) virá de esforços do INSS
(Instituto Nacional do Seguro Social). A expectativa é que a implementação do
Atestmed, sistema online que dispensa a perícia presencial para a concessão do
auxílio-doença, gere uma redução de R$ 6,2 bilhões.
Segundo os técnicos do governo, embora o sistema tenha
ajudado a impulsionar as concessões de benefício por incapacidade, o
atendimento mais rápido do segurado evita a necessidade de grandes pagamentos
retroativos, já que a lei garante o repasse do benefício desde a data da
requisição. A fila de espera tornava essa fatura mais cara para o INSS.
Outro R$ 1,1 bilhão deve ser poupado com a implementação de
medidas cautelares, como suspensão de benefícios suspeitos de alguma
irregularidade. Um dispositivo incluído no projeto de lei da desoneração da
folha busca dar maior segurança jurídica para que o INSS adote essas medidas.
"A cautelar evita que a garantia de ampla defesa e contraditório seja
usada de forma abusiva para protelar a cessação [do benefício indevido]",
disse o presidente do órgão, Alessandro Stefanutto.
Outros R$ 6,4 bilhões serão economizados com a revisão do BPC
(Benefício de Prestação Continuada), pago a idosos e pessoas com deficiência de
baixa renda. Desse valor, R$ 4,3 bilhões serão obtidos a partir da convocação
de famílias que estão com cadastro desatualizado, e outros R$ 2,1 bilhões da
revisão pericial de benefícios concedidos a pessoas com deficiência.
O governo suspeita de volumosos pagamentos indevidos no BPC,
após uma explosão na concessão do benefício desde 2022. A revisão, porém,
enfrentou resistências do próprio MDS (Ministério do Desenvolvimento e
Assistência Social, Família e Combate à Fome), gestor da política. Na coletiva,
a pasta não tinha nenhum representante.
"O MDS tem sido um grande parceiro, mas a gente achou
melhor, para caber todo mundo na mesa", afirmou Firpo, quando questionado
sobre a ausência de representante do MDS na entrevista coletiva. INSS e
Previdência Social estavam presentes.
O Executivo ainda espera poupar R$ 3,2 bilhões com a revisão
dos benefícios por incapacidade (como auxílio-doença) e R$ 1,1 bilhão com o
seguro-defeso, pago a pescadores artesanais durante o período em que a
atividade é proibida.
Além, da revisão de gastos, o Executivo também listou aquilo
que chamou de "realocação" de R$ 2,3 bilhões originalmente estavam
previstos para o Bolsa Família. Firpo explicou que o corte para 2025 tem como
premissa a "manutenção do Orçamento de 2023", que foi de R$ 166,3
bilhões. Isso significa uma redução em relação aos R$ 168,6 bilhões programados
para este ano.
Segundo o secretário, ainda não há um detalhamento de quais
medidas serão adotadas pelo MDS para alcançar esses valores, mas o governo
acredita ser possível dar continuidade à revisão cadastral —que contribuiu, no
ano passado, para uma economia de R$ 9,4 bilhões após a revisão de pagamentos a
famílias que não se encaixavam nos critérios do programa.
O governo também prevê uma redução de R$ 2 bilhões na despesa
inicialmente programada para gastos com pessoal em 2025. Segundo os técnicos, a
economia virá do adiamento de concursos públicos.
Outros R$ 3,7 bilhões devem ser poupados com o Proagro,
programa de seguro rural para pequenos e médios produtores que, nos últimos
anos, passou por uma explosão de gastos. O impacto vem tanto de mudanças de
regras quanto de medidas de realocação.
Neste ano, o governo diz ter economizado pelo menos R$ 3,3
bilhões com o Atestmed e a revisão de benefícios por incapacidade, medidas que
tinham impacto total estimado em R$ 8,6 bilhões. Ao todo, o Executivo espera
poupar R$ 10 bilhões neste ano com a revisão de gastos.
O secretário do RGPS (Regime Geral de Previdência Social),
Adroaldo Portal, disse que, dos 800 mil benefícios que devem ser revisados até
o fim deste ano, 258 mil já passaram por perícia num período de 45 dias. Desse
grupo, 133 mil tiveram o benefício cessado. "Ou seja, o perito identificou
que aquela incapacidade laboral já havia cessado e que a pessoa estava em
condições de voltar ao trabalho", afirmou.
Nos cálculos do governo, só esta primeira leva de
cancelamentos já garante uma economia de R$ 1,3 bilhão até o fim de 2024.
Segundo Firpo, as revisões seguem uma metodologia e buscam
encontrar espaço fiscal para financiar políticas consideradas prioritárias.
"A revisão não tem como base cessação de direitos. Pelo contrário, tem
como base a garantia de direitos. Ela evita pagamentos indevidos para dar
direito a quem tem direito", afirmou.
"A agenda de revisão de gastos é central. Vamos garantir
que essa agenda siga como proritária e sempre muito ativa do lado do governo.
Buscamos equilíbrio fiscal para que o país cresça com compromisso social",
disse o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan.
Ele comparou a revisão de gastos ao ato de escovar os dentes.
"Tem que fazer isso todo dia", afirmou.
O governo precisa avançar nessas medidas para conseguir
fechar as contas não só de 2024, mas também da proposta orçamentária de 2025.
Para o ano que vem, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) já
anunciou um corte de R$ 25,9 bilhões em despesas para preservar o arcabouço
fiscal. As iniciativas listadas pelo Executivo alcançam esse valor.
"A ideia é que a gente continue nesse processo de avanço
na revisão de gastos e na transparência desse trabalho. A gente está na
antessala do PLOA [projeto de Lei Orçamentária Anual] 2025, daqui dois dias a
gente vai encaminhar a peça orçamentária, e nesse processo a gente achou
importante antecipar um dos elementos que tem sido bastante discutido",
afirmou o secretário-executivo do Ministério do Planejamento, Gustavo
Guimarães.
Os números divulgados pelo governo mostram uma redução no
alcance da revisão do BPC. Inicialmente, como mostrou a Folha de S.Paulo, o
governo previa o cancelamento de 670,4 mil benefícios em 2025, o que renderia
uma economia de R$ 6,6 bilhões em despesas.
Nesta quarta, o Executivo apontou uma estimativa de poupar R$
6,4 bilhões com o cancelamento de 481,7 mil benefícios no ano que vem.
No fim de julho, o governo editou duas portarias com
diretrizes para a revisão do BPC. As normas preveem que o INSS (Instituto
Nacional do Seguro Social) terá de fazer um pente-fino mensal para verificar o
cumprimento dos critérios de renda para acessar a política, voltada a famílias
com renda de até um quarto do salário mínimo por pessoa (equivalente a R$ 353).
Além disso, os beneficiários do BPC que não estiverem
inscritos no Cadastro Único de programas sociais ou que estiverem com seu
registro desatualizado terão de regularizar a situação. O fim de brechas legais
exploradas por quem pede o benefício é um dos pilares da revisão da política.
O ajuste pelo lado das despesas enfrenta resistências dentro
do próprio governo e também no PT, sigla do presidente Lula. Como mostrou a
Folha de S.Paulo, o tema foi alvo de um jantar entre ministros do governo e a
cúpula do partido.