
Foto: Divulgação
O forte aumento das despesas com o benefício por incapacidade
temporária (antigo auxílio-doença) tem puxado o crescimento dos gastos do
governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com a Previdência Social.
A quantidade de benefícios explodiu e chegou em maio (último
dado disponível) com uma expansão de 49% em relação ao mesmo mês do ano
passado. Foram pagos 1,6 milhão de benefícios --532 mil a mais do que em maio
de 2023.
É o benefício da Previdência Social que mais cresce e numa
velocidade muito superior à dos demais. O salário-maternidade, por exemplo, que
é o segundo benefício com maior expansão após o auxílio-doença, teve alta no
período de 9%.
O ex-presidente do INSS (Instituto Nacional de Seguro
Social), Leonardo Rolim, disse à Folha que a disparada das despesas com o
auxílio-doença exige uma resposta rápida do governo e coloca em xeque o
Atestmed, sistema que dispensa a perícia presencial e que permite a inclusão do
atestado médico pela internet.
Ao dispensar a emissão de parecer conclusivo da perícia
médica, o Atestmed possibilita que o auxílio-doença possa ser concedido sem que
o segurado tenha que esperar a perícia médica presencial. O segurado pode fazer
o pedido e enviar a documentação pelo aplicativo Meu INSS ou levar na própria
agência.
Consultor da Câmara e um dos especialistas que trabalharam na
elaboração da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da reforma da Previdência
de 2019, Rolim diz não ter dúvida de que o desenho atual do Atestmed abriu
brechas para uma farra de irregularidades, o que acabou acelerando a concessão
dos benefícios, inclusive por meio de compra de atestados médicos falsos.
Rolim chama atenção para o crescimento das fraudes
cibernéticas que também vêm contribuído para o aumento das despesas
previdenciárias -hoje um dos principais fatores de risco para o equilíbrio das
finanças do governo e sobrevivência do arcabouço fiscal, a nova regra para as
contas públicas aprovada no ano passado.
Ele calcula que a concessão indevida do auxílio doença custa
por ano cerca de R$ 12 bilhões para o governo. Com os problemas no BPC, o
impacto sobe para R$ 25 bilhões, de acordo com os seus cálculos.
Nos seis primeiros meses deste ano, dados do Tesouro Nacional
apontaram que os gastos com Previdência e o BPC (Benefício de Prestação
Continuada) cresceram R$ 48 bilhões, reforçando a pressão desses benefícios
sobre as contas públicas.
O ex-presidente do INSS avalia que as medidas de correção dos
problemas são tão ou mais urgentes do que as anunciadas nesta semana pelo
governo para o BPC. Duas portarias do governo endureceram as regras de
concessão e estabeleceram regras para uma revisão cadastral do BPC.
"Não tem nenhuma justificativa. O que é que aconteceu no
mercado de trabalho brasileiro ou no mundo da saúde brasileira? Tem alguma
doença em massa acontecendo no país para justificar um aumento de mais de 50%?
Não existe", alerta Rolim.
Integrantes da grupo de trabalho do governo que têm adotado
medidas para revisão de gastos dos benefícios previdenciários e assistenciais
avaliam que a implementação do Atestmed libera força de trabalho para a
perícia.
Eles argumentam que, embora o sistema tenha aumentado as
concessões com a redução da fila, o saldo líquido será positivo, principalmente
pela diminuição dos pagamentos por falta de análise.
Um integrante da JEO (Junta de Execução Orçamentária)
antecipou à Folha de S.Paulo que medidas adicionais de combate às fraudes serão
anunciadas, inclusive por meio de mudanças legais. A ideia é apresentar as
propostas na volta do recesso do Congresso de julho.
A JEO é um colegiado que decide sobre assuntos orçamentários.
Lula autorizou a JEO neste mês a liderar um processo de revisão dos benefícios
para garantir uma economia de R$ 25,9 bilhões em 2025 com o pente-fino.
Em nota técnica preparada para consultoria da Câmara, Rolim
recomenda que para o enfrentamento à fraude no auxílio doença é preciso criar
um fluxo de envio do atestado direto pelo médico ou pelo hospital ao invés do
envio pelo segurado.
Além disso, Rolim propõe que não haja prorrogação por
atestado. "A prorrogação deveria ser por perícia, ainda que seja perícia
remota", diz.
Rolim sugere também que concessão por Atestmed seja limitada
no máximo a três meses. Para evitar que a fila volte a crescer, o especialista
recomenda também que seja disponibilizado, sem limites, bônus para os peritos
fazerem o máximo de perícias possível.
"Além disso, tem que utilizar software de Inteligência
Artificial para combater fraudes cibernéticas, tal qual foi feito no passado
com o seguro defeso", diz.
Em evento nesta sexta-feira (26), o ministro da Previdência
Social, Carlos Lupi, voltou a defender o Atestmed, porque, segundo ele, por
meio da implementação de novas tecnologias, o sistema potencializa a produção
dos servidores e, consequentemente, qualifica a vida dos trabalhadores e
segurados. O INSS já anunciou que vai usar IA para combater as fraudes
Em abril, Lupi previu ao Painel que, até agosto, todos os
benefícios do INSS ligados à saúde, entre eles salário-maternidade, serão
concedidos via Atestmed.