
Cigarro Crédito: Divulgação/ONU
Ferramenta desenvolvida pelo Banco Mundial traz, pela primeira vez,
estimativa das alíquotas do Imposto Seletivo, o chamado "imposto do
pecado", que incidirá sobre itens considerados nocivos à saúde e ao
ambiente. Trata-se de um dos pontos de maior divergência na regulamentação da
reforma tributária, que começará a ser analisada por um grupo de trabalho na
Câmara dos Deputados.
O organismo internacional, que acompanha de perto a mudança nos tributos
brasileiros e seus impactos distributivos, considerou uma taxa de 32,9% para os
refrigerantes; 46,3% para cerveja e chope; 61,6% para outras bebidas
alcoólicas; e 250% no caso dos cigarros.
Esses porcentuais foram projetados pelo banco com base em informações
repassadas pelo Ministério da Fazenda, mas não refletem as cobranças exatas do
Seletivo, que têm particularidades conforme o produto, e só serão definidas
futuramente, por meio de lei ordinária.
Em nota, a Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária afirma que
repassou aos economistas do banco as alíquotas consideradas pela equipe de
quantificação, as quais têm o objetivo de manter a carga tributária desses
produtos. Os técnicos da Fazenda frisaram, porém, que se trata de
"hipóteses de trabalho".
O objetivo dos economistas do banco foi dar uma dimensão a essas
cobranças e, assim, viabilizar simulações no âmbito do novo sistema tributário
- que terá uma segunda guerra de lobbies no Congresso.
Tributaristas alertam que essa fase de regulamentação da reforma será
ainda mais intricada e delicada do que o texto da Proposta de Emenda à
Constituição (PEC), promulgado no ano passado. Cada vírgula, das 360 páginas da
lei complementar, poderá ter impacto na alíquota final do Imposto sobre Valor
Agregado (o IVA, que unificará cinco tributos).
Por isso, a aposta do banco na criação da ferramenta, que foi batizada
de Simulador de Imposto sobre Valor Agregado (SimVat, na sigla em inglês). A
intenção do organismo é de que pesquisadores, parlamentares e contribuintes
testem os efeitos de eventuais alterações na lei.
"Ao lançar o SimVat, o Banco Mundial enfatiza a importância de usar
evidências concretas e sugestões baseadas em dados para inspirar o texto final
da reforma", diz Shireen Mahdi, economista principal da entidade para o
Brasil.
A ferramenta mostra, por exemplo, que, caso não haja incidência de
Seletivo sobre bebidas alcoólicas, refrigerantes e cigarros, a alíquota-padrão
do novo IVA passaria de 26,5% para 28,1%. A Fazenda tem destacado que o imposto
do "pecado" não tem fins arrecadatórios, e sim regulatórios - de
combater hábitos de consumo nocivos à saúde e ao ambiente.
No entanto, como uma das premissas da reforma é ser fiscalmente neutra,
mantendo a carga tributária vigente, todo o sistema está inevitavelmente
interligado. Logo, se a cobrança é reduzida em uma ponta, ela tem de aumentar
em outra para compensar.
No caso da cesta básica, outro tema controverso, o SimVat mostra que
novas ampliações da lista, combinadas com a eliminação do cashback (devolução
de imposto aos mais pobres), podem ser uma maneira ineficiente de ajudar os
mais vulneráveis.
Se a isenção fosse estendida a todos os alimentos e não houvesse o
cashback, a alíquota do IVA, segundo a plataforma, aumentaria de 26,5% para
28,3%.
Nesse caso, os 10% mais ricos da população teriam um leve aumento de
carga tributária, que passaria de 8,2% para 8,3%, como proporção da renda. Já
os 10% mais pobres veriam a sua taxação saltar de 22,1% para 25,3%.
"Com dados oportunos e valiosos, os formuladores de políticas podem
tomar decisões informadas que têm grandes impactos, especialmente para
populações vulneráveis", diz Shireen, do Banco Mundial.
A cesta básica, no entanto, é um ponto de embate entre setores e para o
qual ainda não há consenso no âmbito do Congresso Nacional. Os supermercados e
o agronegócio, por exemplo, não abrem mão de incluir as carnes na lista do
imposto zero, e já iniciaram conversas com parlamentares para viabilizar essa
alteração.
O argumento é de que a proteína animal pode acabar saindo de vez da
dieta dos mais pobres. Pelo projeto do governo, as carnes foram enquadradas na
alíquota reduzida, com desconto de 60% da padrão, à exceção de alguns itens
considerados de luxo, que pagarão alíquota cheia.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI), por sua vez, vai na direção
contrária e já firmou posição contrária à ampliação da lista de produtos com
alíquota zero ou com tributação reduzida, como os itens que integram a cesta.
A preocupação é exatamente com um eventual aumento da alíquota-padrão.
"Não vamos sugerir nenhuma inclusão porque o que a gente quer é que a
alíquota de referência seja a menor possível, que é onde todo mundo vai
pagar", afirmou ao Estadão o superintendente de Economia da CNI, Mário
Sérgio Telles.
Por Correio24horas