Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil
O tenente-coronel Mauro Cid
afirmou à Polícia Federal, em depoimento de mais de nove horas na segunda-feira
(11), que não participou até o fim da reunião do ex-presidente Jair Bolsonaro
(PL) com os comandantes das Forças Armadas em que os presentes teriam discutido
um plano golpista.
Segundo pessoas com conhecimento
do depoimento, o militar disse que participou somente da primeira parte do
encontro, quando o assessor para assuntos internacionais da Presidência, Filipe
Martins, teria apresentado um documento que detalhava uma série de supostas
interferências do Judiciário no governo Bolsonaro.
De acordo com o que Cid disse
aos investigadores, as acusações à Justiça foram apresentadas naquela reunião
em formato de considerandos --parte inicial de decreto que busca dar legalidade
ao ato presidencial. Um dos exemplos dados por Mauro Cid de fatos que seriam
elencados no texto é a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de impedir a
posse de Alexandre Ramagem na direção da Polícia Federal.
O documento, segundo a versão
apresentada por Cid, não continha na sequência um decreto nem medidas
antidemocráticas, como a prisão de ministros do Supremo.
Cid afirmou que Bolsonaro pediu
para que a segunda parte da reunião fosse somente entre ele e os então chefes
militares: Freire Gomes (Exército), Almir Garnier (Marinha) e Baptista Júnior
(Aeronáutica).
Segundo relatos, foi nesse
momento que o então presidente teria sondado os comandantes sobre o apoio da
caserna a possíveis ações golpistas a serem realizadas diante das supostas
interferências do Judiciário.
Mauro Cid disse aos
investigadores que, como não participou de toda a reunião, não saberia dizer
com precisão como cada um dos chefes militares reagiu à sondagem do então chefe
do Executivo.
Ele reforçou, porém, que relatos
repassados a ele e mensagens que circulavam nos meios militares diziam que
Garnier teria colocado a Marinha à disposição de ações golpistas.
De acordo com a versão do
tenente-coronel, Garnier vinha dizendo que havia cerca de 700 homens a postos
em Brasília. Cid contou não ter ouvido do próprio chefe da Marinha essa versão.
O depoimento de Mauro Cid é
sigiloso e sequer a defesa do militar tem acesso ao documento com a íntegra do
que ele relatou à Polícia Federal. Advogados de outros alvos têm dito que
investigadores usam os vazamentos de trechos dos depoimentos para reforçar
narrativas.
O tenente-coronel depôs pela
quarta vez à Polícia Federal no âmbito da delação premiada que firmou em
setembro de 2023 com a PF. A oitiva durou cerca de nove horas e, segundo
relatos feitos à Folha de S.Paulo, boa parte do tempo foi dedicada à confirmação
do que Cid já havia falado aos investigadores nos encontros anteriores.
O militar disse no depoimento de
segunda que enviava mensagens com frequência para o então comandante do
Exército, general Freire Gomes, enquanto Bolsonaro sondava auxiliares e aliados
políticos por um apoio à ruptura democrática.
Os contatos passaram a ser mais
frequentes em meados de novembro, quando a cúpula militar tentava descobrir
quem do Palácio do Planalto vazava informações internas da Força e orquestrava
ataques à reputação dos generais contrários ao golpe --chamados de "generais
melancias" nas redes sociais, em falsa referência de que os militares
seriam comunistas.
Mauro Cid também alegou aos
investigadores que reuniões apontadas como golpistas no relatório da PF que
embasou a operação Tempus Veritatis eram, na verdade, encontros de amigos
militares.
No relatório, a Polícia Federal
diz que, em 28 de novembro de 2022, Bolsonaro participou de reunião com outros
militares com formação em forças especiais. Segundo mensagens trocadas entre
Cid e o coronel Bernardo Romão Correa Neto, o encontro seria entre os militares
que atuavam como assistentes de generais do Alto Comando do Exército.
Na versão apresentada por Cid, o
encontro no fim de novembro não foi para tramar um golpe de Estado e só ocorreu
porque o Alto Comando do Exército se reunia em Brasília naquela semana. Os
coronéis assistentes dos generais, portanto, estavam na capital federal.
Como há divisões dentro do
Exército e rivalidades entre os forças especiais e os precursores (outra
especialização na carreira), os militares costumam participar de encontros
separados.
Naquele caso, segundo disse Cid
aos investigadores, havia insatisfação nas fileiras militares com a vitória
eleitoral de Lula (PT). Por isso, o tema foi conversado entre os oficiais, mas
sem, de acordo com a versão do tenente-coronel, configurar um planejamento de
um golpe de Estado.
A delação foi acertada enquanto
a PF avançava sobre suspeitas de Cid e seu pai, o general Mauro Lourena Cid,
terem vendido joias recebidas por Bolsonaro como presentes de Estado para o
ex-presidente ficar com o dinheiro.
Quando fechou a delação, Mauro
Cid também se dizia disposto a colaborar com a investigação da PF sobre a
fraude no cartão de vacinação que o militar teria feito para permitir que
familiares e Bolsonaro pudessem viajar aos Estados Unidos mesmo sem terem sido
imunizados contra a Covid-19.
As investigações, porém,
avançaram em outro sentido. O foco passou a ser as discussões que Bolsonaro e
aliados teriam feito para tentar evitar a posse de Lula.
Por Bahia
Notícias