O gasto do
poder público brasileiro com os tribunais de Justiça, incluindo remuneração de
magistrados e servidores, consome o equivalente a 1,6% do PIB (Produto Interno
Bruto), um recorde entre 53 países analisados pelo Tesouro Nacional e quatro
vezes a média internacional (0,4% do PIB).
A comparação inédita, publicada nesta
quarta-feira (24) pelo órgão do Ministério da Fazenda, considera dados de 2021,
os mais recentes disponíveis para os países analisados.
Em 2022, a despesa com tribunais se manteve
em 1,6% do PIB. Os gastos também incluem o Ministério Público.
Em valores absolutos, a fatura chegou a R$
159,7 bilhões (em valores de dezembro de 2022), dos quais R$ 131,3 bilhões
foram direcionados ao pagamento de remunerações e contribuições a magistrados e
servidores --o equivalente a 82,2% do total.
Para se ter uma ideia, o valor é maior que
os R$ 113 bilhões gastos em 2022 com o então do programa Auxílio Brasil, que
atendeu naquele ano 21,6 milhões famílias em dezembro. Neste ano, o Orçamento
reserva R$ 168,6 bilhões para a política social, rebatizada de Bolsa Família.
O relatório do Tesouro também aponta que o
valor destinado aos tribunais de Justiça representa mais da metade de todo o
montante direcionado à rubrica ordem e segurança pública.
O relatório do Tesouro também aponta que o
valor destinado aos tribunais de Justiça representa mais da metade de todo o
montante direcionado à rubrica ordem e segurança pública.
O montante ainda é superior aos gastos com
os serviços de polícia no Brasil (R$ 114 bilhões), em um contexto em que o país
vive uma crise na segurança pública.
As despesas dos demais países com tribunais
de Justiça não estão classificadas por tipo e, por isso, o Tesouro não consegue
fazer uma comparação mais detalhada para saber se a proporção de gastos com
pessoal no Brasil destoa do cenário internacional.
Mas o custo do sistema de Justiça no Brasil
tem sido alvo de constantes críticas de diferentes segmentos da sociedade, em
particular por causa do pagamento de uma série de adicionais que driblam o teto
remuneratório do funcionalismo, os chamados penduricalhos.
O teto para os servidores federais está hoje
em R$ 41.650,92, e os limites aplicados em estados e municípios ficam abaixo
disso. Mesmo assim, é corriqueiro no Judiciário e no Ministério Público
decisões que criam parcelas adicionais, em geral fora do teto.
A lista inclui auxílios e benefícios por
excesso de serviço (medido em número de processos) e por acúmulo de função
administrativa, entre outros.
Os juízes também contam com 60 dias de
férias por ano, o dobro do que é garantido aos demais trabalhadores (30 dias).
Segundo o documento do Tesouro, o maior
gasto vem dos tribunais estaduais, com R$ 92,1 bilhões em 2022. Na sequência
estão os tribunais federais, com R$ 63,8 bilhões, o que inclui a Justiça do
Trabalho, Justiça Federal e cortes superiores, como STJ (Superior Tribunal de
Justiça) e o STF (Supremo Tribunal Federal).
A Câmara chegou a aprovar em julho de 2021
um projeto de lei que combate os supersalários no serviço público. A proposta
tem o apoio do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas está parada no
Senado.
O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco
(PSD-MG), tem afirmado que é favorável à proposta, desde que o Senado avance na
tramitação da PEC (proposta de emenda à Constituição) do quinquênio, que
concede um adicional remuneratório a juízes, procuradores e defensores.
Na prática, como mostrou a Folha de S.Paulo,
a aprovação da PEC virou instrumento de barganha em troca da aprovação do
projeto que mira os supersalários.
O principal ponto da proposta é resgatar um
benefício extinto em 2006 e que prevê a concessão de um adicional de 5% do
salário a cada cinco anos de serviço --cada servidor poderia acumular até sete
aumentos. A verba ficaria livre do teto remuneratório e seria concedida a quem
já está na carreira e a quem já está aposentado.
Além disso, o texto também assegura aos
membros do Judiciário e do Ministério Público que a sua atuação jurídica
anterior (na advocacia, por exemplo) possa ser usada para efeitos de contagem
de tempo de exercício.
O governo Lula é contra a PEC, pois a medida
poderia gerar um efeito cascata sobre as demais carreiras e também sobre
estados e municípios, anulando qualquer economia obtida com a regulamentação do
teto remuneratório.
Um estudo divulgado pelo CLP (Centro de
Liderança Pública) afirma que a regulamentação do teto remuneratório do
funcionalismo pode gerar uma economia de R$ 3,9 bilhões ao ano. A cifra
considera os servidores da União, de estados e municípios que recebem verbas
acima do limite.
Já a PEC do quinquênio pode gerar um custo
adicional de R$ 4,5 bilhões para União, estados e municípios, segundo cálculos
feitos por técnicos do governo no ano passado.
Uma eventual extensão da benesse a todas as
carreiras elevaria o gasto anual a R$ 10 bilhões nas três esferas.
Nos últimos meses, o governo Lula tem
tentado dialogar com Pacheco sobre a possibilidade de pautar a proposta que
combate os supersalários, mas sem deflagrar a retomada da PEC do quinquênio.
A articulação ocorre num contexto em que o
Executivo é cobrado a apresentar uma reforma administrativa e a conter o
crescimento de gastos.
Na segunda-feira (22), o ministro Fernando
Haddad (Fazenda) deu uma sinalização de que os demais Poderes precisam
participar do debate.
Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV
Cultura, ele disse ser favorável a iniciar uma discussão sobre os gastos, mas
ressaltou que deveria começar pelo "andar de cima".
"Eu penso que seria de bom tom nós
discutirmos os três Poderes, o que nós podemos fazer", afirmou o ministro.