Foto: Banco Central
O governo de Luiz Inácio Lula da
Silva (PT) vai enviar um projeto de lei ao Congresso Nacional para recompor
verbas de programas como Auxílio Gás, Farmácia Popular e bolsas de ensino
superior.
Os recursos foram cortados pelos
parlamentares durante a tramitação do Orçamento de 2024, com o objetivo de
abrir espaço à ampliação das emendas de comissão -usadas para irrigar redutos
eleitorais dos congressistas. Com a mudança, as emendas chegariam ao patamar
recorde de R$ 53 bilhões.
Nesta segunda-feira (22), Lula
sancionou o Orçamento de 2024 com um veto de R$ 5,6 bilhões nas emendas de
comissão, o que reduz o montante à disposição dos congressistas. O espaço será
redistribuído entre as ações que foram alvo da tesourada.
O governo não tem um prazo
definido para enviar o projeto de lei com o remanejamento, já que os programas
podem começar a rodar com os valores já assegurados no Orçamento deste ano. Mas
a ideia é resolver o impasse ao longo dos próximos meses.
O principal obstáculo do governo
deve ser a insatisfação do Congresso com o veto às emendas. O relator-geral do
Orçamento, deputado Luiz Carlos Motta (PL-SP), admitiu em entrevista a
jornalistas que, na falta de um acordo para restabelecer as emendas, os
parlamentares poderão derrubar o veto presidencial.
A decisão de barrar parte das
emendas é delicada do ponto de vista político, pois cria mais um foco de tensão
entre o Executivo e o Legislativo. Mas técnicos do governo afirmam nos
bastidores que o veto é uma forma de restabelecer o teor do acordo feito no ano
passado com o Congresso, que turbinou as emendas de comissão para R$ 16,6
bilhões, mais do que os cerca de R$ 11 bilhões acertados.
Na época, o governo aceitou
reduzir em R$ 6,3 bilhões a estimativa de despesas ligadas ao salário mínimo,
que envolvem o pagamento de aposentadorias, abono salarial e seguro-desemprego,
entre outras. A justificativa foi o reajuste do piso nacional para R$ 1.412,
valor menor que os R$ 1.421 estimados inicialmente.
O Executivo também deu sinal
verde a uma redução de até 10% nas verbas do Novo PAC (Programa de Aceleração
do Crescimento), uma das vitrines da gestão petista. O programa ficou com R$
54,5 bilhões, ante uma proposta inicial de R$ 61,3 bilhões.
O problema é que o Congresso
cortou outros R$ 6,9 bilhões nas despesas discricionárias do Executivo -que não
são obrigatórias e contemplam custeio e investimentos. São esses gastos que o
governo pretende agora recompor.
Interlocutores do governo
afirmam que há uma preocupação no Palácio do Planalto de que o veto não seja
interpretado como uma quebra do acordo.
Em vídeo, o ministro Alexandre
Padilha (Relações Institucionais) lembrou também que a desaceleração da
inflação resultou em uma correção menor no limite de despesas de 2024. No
início do mês, o Ministério do Planejamento e Orçamento informou que esse efeito
daria uma diferença de R$ 4,4 bilhões.
"Fizemos um corte dos
recursos exatamente porque a inflação foi mais baixa. [...] Toda a equipe, no
momento da decisão do corte, resolveu primeiro poupar integralmente saúde,
educação, poupar investimentos no PAC, em segurança pública", disse Padilha,
sinalizando que emendas para essas áreas foram preservadas.
O líder do governo no Congresso,
senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), não descartou a possibilidade de o
governo negociar os vetos com os parlamentares, a depender do desempenho da
arrecadação do governo.
"Para nós é mais
confortável, dentro do orçamento do Executivo, ajustar isso. Alternativamente a
isso, não se descarta também até negociar o próprio veto", disse.
O valor das emendas barradas por
Lula não é suficiente para recompor integralmente os R$ 6,9 bilhões que foram
retirados das despesas discricionárias, mas o governo deve priorizar na
redistribuição aqueles programas que sofreram as maiores perdas.
O Farmácia Popular teve uma
redução de R$ 382 milhões, enquanto o programa de educação e trabalho no
Ministério da Saúde sofreu um corte de R$ 318 milhões.
Também foram alvos da tesoura as
verbas para gestão da Receita Federal (R$ 283 milhões), estruturação de
unidades de atenção especializada em saúde (R$ 268 milhões) e concessão de
bolsas no ensino superior (R$ 151 milhões).
O programa Auxílio Gás, que
repassa às famílias beneficiadas o valor de um botijão a cada dois meses, teve
um corte de R$ 138 milhões. Já os recursos para custear o funcionamento da
Polícia Federal foram reduzidos em R$ 69 milhões.
O Orçamento sancionado prevê
ainda uma meta fiscal de déficit zero, como defendido pelo ministro Fernando
Haddad (Fazenda).
Para alcançar esse objetivo, a
peça orçamentária contemplou uma previsão de R$ 168,5 bilhões em receitas
extras para reforçar o caixa e tentar alcançar o equilíbrio nas contas
públicas. Boa parte delas foi desidratada na tramitação pelo Legislativo.
Nas reavaliações do Orçamento,
que ocorrem bimestralmente a partir de março, a equipe econômica será obrigada
a refazer as estimativas de arrecadação e tirar da conta a parcela das receitas
que não se mostrar viável -o que colocará pressão sobre Haddad em meio ao
debate sobre flexibilizar a meta fiscal, que segue vivo dentro do governo.
O mercado tem demonstrado
ceticismo quanto à realização efetiva de toda essa arrecadação e vê um déficit
de 0,8% do PIB (Produto Interno Bruto) neste ano.
Do lado da despesa, os números
da Previdência também inspiram cautela.
O TCU (Tribunal de Contas da
União) apontou fragilidades na promessa do governo de reduzir em R$ 12,5
bilhões a despesa com benefícios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social)
a partir de revisões de aposentadorias.
A economia foi incluída no
Orçamento aprovado, deixando a despesa subestimada, na avaliação de
especialistas em contas públicas.
Em análise da peça orçamentária,
o TCU informou que "não foi possível concluir sobre a viabilidade, a
razoabilidade e a factibilidade". Como mostrou a Folha de S.Paulo, o
número foi inserido de última hora, a pedido da equipe econômica, para ajudar a
fechar as contas de 2024.