A Argentina voltou a ficar relativamente
mais barata para brasileiros em janeiro, depois de um dezembro encarecido para
estrangeiros no país. Isso porque o dólar ou real "blue", cotação
encontrada pelo turista em casas de câmbio paralelas, subiu novamente nas
últimas semanas, após um mês "adormecido" no início do governo Javier
Milei.
Pagar
com cartão de crédito, o que até novembro era desvantajoso em relação ao
dinheiro em espécie, hoje em dia também não é mais desfavorável aos viajantes,
segundo economistas. É preciso, porém, considerar a cobrança do IOF (Imposto
sobre Operações Financeiras), que é de 4,38% por transação em 2024. O cenário
ainda é instável, e as cotações mudam diariamente.
Desde
que o presidente ultraliberal assumiu a Presidência do país, em 10 de dezembro,
os argentinos têm sofrido uma explosão dos preços em geral, já que ele acabou
com os congelamentos impostos pelo último governo peronista de Alberto
Fernández e promoveu uma desvalorização do peso oficial.
Enquanto
os preços subiam, porém, o dólar ou real próximos ao "blue"
encontrados pelo turista se mantiveram no mesmo patamar nas primeiras semanas.
Ou seja, o estrangeiro parou de ver seu dinheiro se valorizar diariamente em
empresas de transferências como a Western Union e nas chamadas
"cuevas", casas de câmbio que são proibidas apenas na teoria.
Desde
a primeira semana de janeiro, no entanto, essa tendência mudou, e a cotação
paralela voltou a subir por uma série de fatores internos —entre eles uma
possível volta da demanda de argentinos por dólares para fugir dos pesos,
diante da inflação que dobrou e da queda dos rendimentos de investimentos na
moeda local.
Portanto,
por exemplo: o turista que trocou dinheiro no dia 29 de dezembro, último dia
útil do ano, retirou em média 1.000 pesos por dólar ou 190 pesos por real. Já
quem fez isso nesta quinta-feira (18), quase três semanas depois, retirou mais
de 1.200 pesos por dólar ou 240 pesos por real. É uma valorização de mais de
20% frente ao peso.
Mesmo
assim, essa valorização caminha junto com os preços, e alguns brasileiros
relatam uma sensação de que o turismo no país não está tão barato como
pensavam. A referência normalmente é a temporada de inverno, que foi
extremamente vantajosa para estrangeiros, pela longa e constante desvalorização
que a moeda argentina vinha sofrendo na época.
"Achei
os preços das refeições equilibrados com São Paulo, paguei cerca de 50 mil
pesos [R$ 263 na cotação paralela da época] para duas pessoas", conta a
advogada Cecília de Oliveira, 50, que passou a semana passada em Buenos Aires
com o filho.
"Os
eletrônicos achei muito caro, tanto que não comprei nada", diz ela. De
fato, produtos que são importados ou têm componentes importados ainda costumam
ser mais caros na Argentina, levando em conta as restrições a importações que
existiam até o último governo, agora retiradas por Milei.
Cecília
levou reais em dinheiro vivo e também pagou alguns gastos da viagem no cartão
de crédito, o que hoje em dia já não faz mais tanta diferença. Até o final de
2022, compras com meios eletrônicos no país vizinho podiam custar o dobro.
A
mudança ocorreu porque o valor do dólar "blue" atualmente está muito
próximo ao do chamado dólar MEP (mercado eletrônico de pagamentos), referência
para a cotação cobrada nos cartões de crédito estrangeiros no país. Usar contas
internacionais como a Wise pode ser ainda mais vantajoso, porque o IOF é de
apenas 1,1%.
O
economista argentino Ignacio Galará, do Centro de Estudos Monetários e
Financeiros de Madri, pondera que o mercado paralelo é muito volátil e muda dia
a dia, então todas essas tendências podem se modificar a qualquer momento.
"Hoje eu posso te dizer que o 'blue' é mais vantajoso, mas amanhã pode ser
diferente", diz.
Ele
também dá uma dica a quem vai viajar ao interior do país vizinho: "Talvez
seja mais conveniente, ou até necessário, levar dinheiro vivo e trocar no
mercado paralelo. Normalmente nessas regiões a taxa de câmbio é muito mais alta
do que em Buenos Aires, já que há menos oferta, e pagamentos eletrônicos não
costumam ser tão difundidos. Com dinheiro, você também pode obter
descontos".
A
Argentina tem até hoje muitas limitações para a compra de dólares e convive com
várias cotações diferentes, a depender do setor. São políticas usadas até aqui
para tentar conter a fuga da moeda americana, já que a nação vive uma escassez
histórica de reservas, causada por altas dívidas externas contraídas ao longo
de suas diversas crises.
Milei
promete unificar esses câmbios e liberar a compra de dólares, mas defende que
antes precisa resolver os déficits do país, senão causaria uma hiperinflação
ainda maior. Por isso, agora ele tem focado em cortar gastos e funcionários
públicos e em destravar no Congresso as radicais reformas que propôs por meio
de um decreto e um pacote de projetos de lei.