Foto: Rovena Rosa / Agência Brasil
Em torno de 700 milhões de
pessoas sobrevivem com menos de US$ 2,15 (R$ 10,50) por dia. São os mais pobres
entre os pobres do planeta.
Esse número era 40% menor em
2010. Mas o combate à pobreza sofreu um imenso revés com a pandemia de
Covid-19, o que motivou um recuo de três anos no combate à baixíssima renda.
A informação está em relatório
que o Banco Mundial publicou em dezembro. A instituição afirma que, em razão da
pandemia, 2022 foi um ano de incertezas. Mas no ano passado as coisas andaram
para trás, e 2023 foi o ano do aumento das desigualdades.
O diagnóstico é grave em se
tratando de quem o enuncia. O Banco Mundial tem sede em Washington e é gêmeo do
FMI (Fundo Monetário Internacional). Sua missão explícita é a de provar que o
capitalismo é o único meio que dá acesso ao crescimento econômico e à redução
das desigualdades. Não é o que está acontecendo.
Por uma desagradável
coincidência, no ano passado o Banco Mundial redesenhou o projeto que vem
aplicando desde que foi criado, no pós-guerra. Seu presidente, o economista
americano de origem indiana Ajaypal Singh Banga, definiu como novo objetivo a
criação de um mundo sem pobreza dentro de um ambiente ecologicamente saudável.
Essa meta está visivelmente
situada num futuro remoto. O relatório do banco afirma que o combate à pobreza
empacou mesmo nas faixas de renda menos precárias, que vão de US$ 3,65 a US$
6,85 (ou R$ 17,80 a R$ 33,30) por dia, esta última mais próxima da classe média
baixa.
A contrapartida a esse quadro
está na constatação de que os países com baixa renda média, ao contrário dos
que são bem mais pobres, reagiram às políticas adotadas no pós-Covid, ou seja,
continuam a reduzir a pobreza. Exemplos disso são o México, a África do Sul e o
Brasil, países que o relatório não cita nominalmente, mas que estão nessa
categoria segundo a classificação da instituição.
O desdobramento imediato da
questão da renda é a dívida externa, problema que levou, com a pandemia, os
países mais pobres a serem fritados impiedosamente. Traduzindo em números: em
razão dos juros altos decorrentes da crise da Covid, a dívida externa dessas
nações cresceu US$ 453,5 bilhões (R$ 2,2 trilhões). Não é um dinheiro que elas
pagaram; é o que elas passaram a dever a mais.
O custo da dívida para esses
Estados mais pobres aumentou 4,8% entre 2021 e 2022. Essas economias ficaram
com menos dinheiro para investir em saúde, educação ou programas ambientais,
diz o banco.
O terceiro tópico em que o
relatório se detém é o dos prospectos para a economia global. Resumindo, foram
12 meses de desastres, com crescimento insuficiente da economia e alta
inflação, o que levou à adoção de taxas de juros crescentes. Esse quadro não teria
cores tão carregadas caso a Rússia não tivesse tido a desastrada ideia de
invadir a Ucrânia.
O tópico seguinte é a derrubada
das previsões de crescimento econômico em decorrência da Covid e do conflito na
Ucrânia. O conflito, aliás, é um dos poucos momentos em que o relatório dá nome
aos personagens geográficos; de resto, ele não identifica os agentes que cita.
O relatório termina com a
questão do clima e com a ascensão das mulheres em postos de trabalho ou de
comando.
Ambos os balanços são bastante
negativos. A quantidade de gases de efeito estufa lançados na atmosfera
ultrapassou a pior das previsões, e o aquecimento do planeta é a prova mais
candente disso. Quanto a ele, só uma previsão dramática e importante: até 2050,
segundo o banco, 216 milhões de pessoas serão obrigadas a migrar para outros
cantos de seus países diante da impossibilidade de conviverem com o clima do
local em que nasceram.
Com relação às mulheres no
mercado de trabalho, o Banco Mundial adota posição semelhante a outras
entidades (ONGs, partidos, universidades) que defendem a postura identitária
nos Estados Unidos. Por meio da constatação, e é um exemplo, de que, em todo o mundo,
2,4 bilhões de mulheres têm menos direitos que os homens para o exercício de
funções para as quais elas são igualmente qualificadas. Essa igualdade de
condições pode ser bem trivial, como a alfabetização
O relatório cita um estudo em
190 países em que a mão de obra feminina é menos valorizada e nas quais elas
ocupam menos instâncias de comando.
Outro estudo interessante do
banco consiste em construir um índice de desigualdade por gênero no mercado de
trabalho. Entre 2022 e 2023, as mulheres, que tinham apenas 77 pontos (contra
100 para os homens), cresceram em só meio ponto na escala. Ou seja, estão com
77,5 contra os mesmos 100 pontos para os homens. Elas têm menos empregos e
recebem por eles salários menores.