Baianas participaram da lavagem Crédito: Paula Fróes/CORREIO
A associação da limpeza da Basílica Santuário do Nosso Senhor
do Bonfim, nos anos iniciais das festividades, ao culto ancestral a Oxalá deu
um novo significado à manifestação cultural que é marca simbólica da
tradicional Lavagem do Bonfim. A baiana Maria do Amparo, 63, celebra o
sincretismo religioso há 10 anos, no Largo do Bonfim, e foi uma das integrantes
do coletivo de baianas que lavaram o adro e as escadarias do templo nesta
quinta-feira (11).
Filha de Oxalá, considerado o orixá supremo, a baiana destaca
a importância da união das religiões durante o cortejo. "Essa é uma
tradição de paz. Por meio dela, pedimos proteção ao nosso pai Oxalá, além de
conquistas e realizações", afirma.
Maria do Amparo é tão apaixonada pela tradição da lavagem que
não conseguiu dormir de quarta (10) para quinta-feira (11), ansiosa. "É o
momento que nós pedimos a Deus muito amor e sabedoria para viver. E que Oxalá
nos dê saúde para lutar pelo o que queremos", completa.
Cumprir o trajeto de quase 8 quilômetros entre a Basílica
Santuário Conceição da Praia até a Basílica Santuário do Nosso Senhor do Bonfim
não é mais uma realidade da baiana Avani Adams, 76 anos, uma das responsáveis
por lavar o adro e as escadarias da igreja do Bonfim no dia da tradicional
festa. Embora não realize o percurso em razão idade, a filha de Oxum chega cedo
ao Largo para cumprir o ofício de mais de 55 anos.
Antes das 8h desta quinta-feira (11), quando os devotos que
fazem a caminhada ainda estão chegando no Comércio, Avani marca presença no
Largo do Bonfim ao lado das colegas baianas. "Nós aguardamos o cortejo
chegar ao lado da igreja. É muito importante fazer parte desta celebração. Sem
as baianas, não existiria Lavagem do Bonfim", diz.
Conhecida como uma das festas que melhor representa o
sincretismo religioso no estado, quiçá do Brasil, a Lavagem do Bonfim é
celebrada por católicos e pelo povo de santo. Quem é católico celebra Jesus, o
Senhor do Bonfim, enquanto o povo de santo honra Oxalá. Neste ano, a festa
também faz menção aos 270 anos da inauguração da Basílica Santuário.
"Nós, de matriz africana, celebramos Oxalá, o primeiro e
maior. É muito para nós celebrar esse dia", afirma.
O respeito por todas crenças fez parte do discurso do reitor
da basílica, padre Edson Mentes, antes da bênção. "Devemos combater o
racismo, o radicalismo e violência. Não devemos fortalecer as culturas dos
muros, mas sim as culturas do encontro, do amor, da fraternidade e da
paz", afirma o sacerdote.
Colega de Avani, Edivalda Oliveira, 67, também aguarda a
procissão chegar ao lado do templo. A baiana faz parte da tradição desde os 10
anos, acompanhada da avó, que também lavava as escadarias. "Lavar as
escadarias é um movimento simbólico. Nós usamos água de cheiro, que é limpa o
corpo e tira tudo que é negativo", afirma.
Lucília Menezes, 84, não sabe dizer com exatidão quando
começou a participar da Lavagem do Bonfim. Desde menina, a baiana era a
companhia da mãe, fiel devota do Senhor Bonfim. Lucília é baiana receptiva,
aquela que participa de eventos culturais, mas não vende o acarajé, e católica.
Ela, assim como o trio acima, defende a união entre o catolicismo e as
religiões de matriz africana. "O povo do candomblé celebra Oxalá e nós,
católicos, celebramos Senhor do Bonfim. É tradição", afirma.
O adro e as escadarias foram lavados por volta das 14h, após
a chegada do governador Jerônimo Rodrigues. Cada baiana com seus potes de água
e as plantas preferidas de seus orixás. Avani Adams, por exemplo, levou o
manjericão miúdo, de preferência do seu orixá. "Oxum e Iemanjá gostam de
flores cheirosas. Outros orixás gostam de plantas mais 'pegadas', como aroeira
e espada de Ogum", diz Avani.
Por Correio24horas