Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil
Após
abandonar a magistratura no final de 2018 para ingressar no governo Jair
Bolsonaro (PL) , Sergio Moro (União Brasil-PR) entrará em seu sexto ano formal
na política sob turbulências em série: enfrenta um novo desgaste com críticas
por sua postura na votação da indicação de Flávio Dino ao STF (Supremo Tribunal
Federal) e vê crescer os riscos de uma decisão da Justiça Eleitoral que pode
cassar seu mandato de senador.
O último
revés foi a posição do Ministério Público, na quinta-feira (14), para que seja
acolhida parcialmente a ação eleitoral contra Moro com a cassação do mandato
por abuso de poder econômico durante a pré-campanha em 2022.
Políticos
de esquerda e de direita dão como certo que o resultado final, tanto no TRE
(Tribunal Regional Eleitoral) do Paraná como nos tribunais superiores, será o
mesmo do ex-deputado federal Deltan Dallagnol, que teve o mandato cassado em
maio.
Moro como
juiz e Deltan como chefe da equipe de procuradores da Lava Jato foram os
protagonistas da Lava Jato, que virou de ponta-cabeça o mundo político de 2014
a 2019. A operação entrou em declínio após as revelações de mensagens que
indicaram atuação alinhada entre os dois.
Na
quarta-feira (13), Moro foi fotografado rindo ao cumprimentar Flávio Dino,
ministro do presidente Lula visto como inimigo pelo bolsonarismo e por setores
da direita que se alinham ao ex-juiz da Lava Jato.
Além disso,
Moro se negou a anunciar publicamente como votou, contra ou a favor da
indicação de Dino, o que o transformou em alvo nas redes sociais, da esquerda à
direita.
O desgaste
de Moro junto à direita foi ampliado pela revelação de trocas de mensagem entre
ele e aliados no dia da aprovação de Dino.
Uma dessas
trocas de mensagem, registrada pela Folha de S.Paulo, indica que Deltan estava
"desesperado". Pessoas próximas afirmaram que a reação emocional de
Deltan tinha a ver com o fato de Moro não ter declarado voto contra Dino e que
isso sinalizaria, para ele, que o ex-juiz teria votado pela aprovação —a
votação é secreta.
Na frente
judicial, o Ministério Público do Paraná defendeu a cassação do mandato do
ex-juiz em parecer assinado pelos procuradores da República Marcelo Godoy e
Eloisa Helena Machado. Embora entendam que houve abuso de poder econômico, eles
não observam utilização indevida dos meios de comunicação social.
O relator
do processo, o juiz eleitoral Luciano Carrasco Falavinha Souza, deve divulgar
seu voto em janeiro de 2024. O caso pode ser levado para julgamento no plenário
do TRE logo em seguida. Caso condenado, Moro ainda poderá recorrer ao TSE
(Tribunal Superior Eleitoral) e ao STF.
O
diagnóstico dos que já dão como certa a cassação de Moro é fortalecido por dois
argumentos.
O primeiro
é a ausência de sustentação política, que é simbolizada pelo fato de a ação que
ameaça o seu mandato ser assinada pelas duas maiores forças eleitorais da
atualidade, o PT de Lula e o PL de Bolsonaro.
Segundo, o
cenário claramente anti-Lava Jato que passou a dominar o Judiciário nos últimos
anos.
Isso tudo
desemboca no fato de que políticos de esquerda e de direita já fazem aberta
campanha à eleição suplementar para o Senado no Paraná, que ocorrerá caso haja
a cassação do ex-juiz.
A alegação
formal do pedido de cassação e do parecer do Ministério Público é a de que Moro
se utilizou no Podemos e, posteriormente na União Brasil, de uma caríssima
estrutura de pré-candidato à Presidência que, depois, se transformou em uma
candidatura ao Senado, desequilibrando o jogo eleitoral no estado.
"A
lisura e a legitimidade do pleito foram inegavelmente comprometidas pelo
emprego excessivo de recursos financeiros no período que antecedeu o de
campanha eleitoral, porquanto aplicou-se monta que, por todos os parâmetros
objetivos que se possam adotar, excedem em muito os limites do razoável",
diz trecho da manifestação da Procuradoria.
Enquanto a
defesa de Moro fala em gastos módicos e calcula R$ 141.034,70 na pré-campanha,
PT e PL apontam que as somas das despesas são superiores até mesmo ao teto de
gasto permitido no período eleitoral para a campanha ao Senado pelo Paraná no
ano passado, R$ 4.447.201,54.
Para o PL,
Podemos e União Brasil gastaram ao menos R$ 7.600.702,14 com a pré-campanha de
Moro. O PT aponta ao menos R$ 4.790.051,25.
A diferença
nos valores acontece porque cada um seguiu um critério diferente sobre o que
pode ou não ser considerado gasto com pré-campanha e o que era efetivamente
despesa ligada ao ex-juiz ou ao conjunto de pré-candidatos.
A Folha de
S.Paulo procurou Moro, mas o senador não quis se manifestar sobre sua situação
política atual e sugeriu à reportagem que falasse com sua defesa.
O advogado
Gustavo Guedes disse não ver a situação como perdida, ressaltando não haver
razão jurídica para a cassação. "Quem decidir por cassar precisará se
expor. E, caso ocorra, isso abrirá um precedente muito perigoso."
Guedes
também afirmou considerar que Moro conta com respaldo político e jurídico mais
consistente do que o de Deltan. "Tiraram o Deltan, tiraram o Bolsonaro
[tornado inelegível pelo TSE], tiram o Moro? Vão tirar quem depois?",
afirma.
"Há
risco sim, claro, ele é uma pessoa exposta, mas não vejo como um processo de
cartas marcadas. Falavam que ele ia ser cassado em setembro de 2023, em
outubro, e isso não ocorreu. Espero que a Justiça Eleitoral tome uma decisão
técnica."
Nas redes
sociais, Moro vem tentando se defender nos dois flancos.
"Não
me surpreende o intensivo ataque daqueles que desejam ocupar o cargo que
legitimamente conquistei nas urnas, com o apoio do povo paranaense. Aos meus
eleitores e apoiadores, digo: não divulgar o voto na indicação de autoridades é
uma prerrogativa do parlamentar", escreveu o senador.
Moro também
agradeceu a publicação da ex-deputada estadual Janaína Paschoal, que escreveu
ser "muito conveniente a exposição que levou os admiradores dos feitos do
senador Sergio Moro à profunda decepção, às vésperas do julgamento que pode
cassar seu mandato e, pior, torná-lo inelegível".
"Agradeço
a análise técnica Profa @JanainaDoBrasil, pondero para sua reflexão apenas que
carros e segurança não eram vaidade, mas necessidades reais e que não geram
votos", escreveu Moro.
Janaína
havia dito que que Moro errou ao trocar de partido e ao não assumir seu voto na
sabatina de Dino. Ela também havia afirmado que Moro pode "estar sendo
pego pela própria vaidade, de aceitar salário, staff, carros, motoristas pagos
com dinheiro público em período pré-eleitoral".
Na
esquerda, vários congressistas comemoraram nas redes sociais o parecer do
Ministério Público Eleitoral do Paraná.
O deputado
federal Guilherme Boulos (PSOL) —que é pré-candidato à Prefeitura de São Paulo—
publicou um meme com a imagem de rojões sendo disparados e a inscrição "eu
fico muito triste com uma notícia dessas".
Moro
anunciou em 2018 que deixaria a toga apenas quatro dias após Bolsonaro derrotar
Fernando Haddad (PT). No Ministério da Justiça, porém, teve sua atuação
sucessivamente esvaziada pelo então presidente. Saiu em abril de 2020 acusando
Bolsonaro de tentar interferir na Polícia Federal.
Após cerca
de um ano atuando em um escritório de advocacia no exterior, voltou ao Brasil
com a intenção de disputar a sucessão de Bolsonaro. Se filiou ao Podemos, mas
depois migrou para a União Brasil e abandonou a pretensão.
Em 2022,
foi eleito senador pelo Paraná, derrotando o ex-aliado e padrinho político
Álvaro Dias (Podemos).