Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil
O governo
Lula (PT) decidiu editar uma MP (medida provisória) que cria um fundo privado
de financiamento de bolsas para incentivar estudantes pobres a permanecerem no
ensino médio.
O fundo
receberá até R$ 20 bilhões da União, em recursos do Orçamento ou ações de
empresas estatais, e pode ser abastecido por recursos gerados por leilões de
exploração do pré-sal, a partir de contrapartida social imposta às empresas.
A previsão
é que a MP seja publicada no Diário Oficial da União ainda nesta terça (28).
Por ser um
fundo ser privado, a utilização dos recursos ficaria fora das regras fiscais
após os aportes da União. Mas restam dúvidas sobre como os repasses serão
classificados dentro das normas do novo arcabouço fiscal.
O plano do
governo é, a partir do próximo ano, pagar uma bolsa para que jovens pobres não
abandonem a escola. Os alunos poderão receber uma quantia a cada mês e ainda
retirar uma parcela, que ficará em uma poupança, ao fim do ano letivo.
O programa
será voltado a jovens de famílias inscritas no Cadastro Único, porta de entrada
para programas sociais, e dará prioridade a famílias com renda per capita de
até R$ 218,00.
Já havia o
anúncio de criação desse programa, mas integrantes do governo, como o ministro
da Educação, Camilo Santana, indicaram indefinições sobre tocá-lo por projeto
de lei ou MP. Também não estava decidido a composição de um fundo específico
para isso.
Detalhes
sobre valores de bolsas, formas de pagamento e operacionalização do programa
serão estipulados em outro texto legal, a ser editado pelos ministérios da
Educação e da Fazenda. Haverá contrapartidas para os beneficiários, como
frequência, aprovação e participação em exames, como o Saeb (avaliação federal
da educação básica) e o Enem, no caso de alunos do 3º ano.
O volume do
aporte da União para 2024 ainda será definido. Isso passa por negociação
interna no governo.
"Para
fins de avaliação do impacto orçamentário, é importante ressaltar que a
definição de valores da poupança por aluno e o alcance da proposta em termos de
público está condicionada à integralização de cotas, sendo limitado ao teto de
R$ 20 bilhões, no caso da União", diz manifestação de motivos, obtida pela
Folha de S.Paulo.
"Estando
a integralização de cotas pela União condicionada à disponibilidade
orçamentária no referido fundo privado, a medida provisória determina que
valores, formas de pagamento e critérios de operacionalização e utilização da
poupança serão definidos posteriormente em ato dos ministros de Estado da
Educação e da Fazenda."
Trata-se da
criação de um fundo privado da Caixa Econômica Federal com participação da
União e de outros cotistas, pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou
privado. Ainda há previsão de que estados e municípios possam fazer aportes.
Os aportes
da "comercialização de petróleo, de gás natural e de outros
hidrocarbonetos fluidos da União" serão vinculados a recursos de leilões
que ingressem a partir de 2025.
É previsto,
segundo documentos obtidos pela reportagem, que a integralização de cotas pela
União será autorizada em ato do Ministro de Estado da Fazenda e poderá ser
realizada por meio de: ações de sociedades em que tenha participação
minoritária, ações de sociedades de economia mista federais excedentes ao
necessário para manutenção de seu controle acionário ou aporte direto da União,
conforme previsto na Lei Orçamentária Anual.
O ensino
médio representa um dos maiores gargalos da educação brasileira. A evasão é
concentrada entre os mais pobres, e pesquisas apontam que muitos jovens saem da
escola para trabalhar. A taxa de evasão é de 8,8% no primeiro ano do ensino
médio, segundo dados oficiais.
O MEC já
anunciou iniciativas voltadas à alfabetização e à expansão de escolas de tempo
integral. Nos dois casos, o governo patina em levar o dinheiro para as redes de
ensino e escolas —nenhum centavo dos R$ 1 bilhão previstos neste ano para um
novo programa de alfabetização havia sido empenhado até meados de novembro,
como a Folha de S.Paulo mostrou.
A criação
de um programa federal de bolsas no ensino médio foi um compromisso assumido
com a então candidata ao Palácio do Planalto, Simone Tebet. Antes de anunciar o
apoio a Lula, ela pôs como condição a incorporação dessa promessa ao programa
de governo petista. Hoje Tebet é ministra do Planejamento. Já há iniciativas de
sucesso em alguns estados, como Alagoas.
Uma medida
provisória passa a valer assim que editada, mas precisa ser apreciada pelo
Congresso Nacional. O objetivo de iniciar o programa já em 2024 é colocado como
argumento de urgência para o ato, o que é um dos critérios para a edição de uma
medida provisória.
Na semana
passada, integrantes do governo já haviam admitido bancar um programa de
incentivo à permanência de alunos no ensino médio fora do limite atual de
despesas, uma vez que o remanejamento de recursos no Orçamento é considerado
alvo não trivial. O Executivo convive neste momento com um bloqueio de R$ 5
bilhões nas despesas para, justamente, evitar o estouro do limite de gastos de
2023.
Como
mostrou a Folha de S.Paulo, o governo tentou uma manobra no Congresso para
livrar um aporte ainda em 2023 do limite de gastos vigente neste ano, mas
esbarrou nas resistências da oposição. Garantir o repasse ainda este ano piora
a fotografia das contas públicas em 2023, mas tem como vantagem evitar novas
pioras nos próximos anos.