O avanço de partidos do
centrão sobre cargos do governo federal e sobre o Orçamento tem gerado críticas
entre aliados do presidente Lula (PT).
Na semana passada, Lula entregou o comando da Caixa
Econômica Federal ao servidor de carreira Carlos Vieira, que foi indicado pelo
presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Ainda assim, partidos cobram mais
verba e cargos.
A pressão do centrão ocorre no momento em que o governo
busca garantir apoio no Congresso, sobretudo para a aprovação de pautas
econômicas.
O próprio Lula reconheceu que fez um acordo com PP e
Republicanos para a entrada dessas siglas no governo. Ele afirmou que
"precisava desses votos" no Legislativo.
"Eu fiz um acordo com o PP, com Republicanos, acho
que é direito deles, que gostariam de ter espaço com governo, indicar uma
pessoa [Vieira, indicado por Lira] que esteve na Caixa, já foi da Caixa, já
esteve no governo da Dilma, já foi do Ministério das Cidades, uma pessoa que
tem currículo para isso. E eles juntos têm mais de 100 votos, eu precisava
desses votos para continuar o governo", disse na sexta-feira (27).
No mesmo dia, a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann
(PT-PR), criticou a mobilização de parlamentares para controlar fatias ainda
maiores do Orçamento. A deputada afirmou, nas redes sociais, que propostas para
o governo pagar mais emendas "servem para atender apenas interesses
políticos insaciáveis".
"No momento que o país precisa direcionar
investimentos para o crescimento e políticas públicas estruturantes, deputados
querem obrigar o governo a pagar emendas de comissões permanentes. É mais uma
intervenção indevida na aplicação do Orçamento da União", escreveu Gleisi
na plataforma X, o antigo Twitter.
A deputada criticava discussões no Congresso para tornar
impositiva a execução das emendas de comissões, ou seja, obrigar o governo a
pagar uma verba que corresponde a R$ 7,5 bilhões em 2023. Se for aprovada, essa
mudança reduz o controle do governo Lula sobre a execução do Orçamento de 2024,
ano de eleições municipais.
A cúpula do Congresso ainda avalia outros caminhos para
ditar o ritmo da liberação das emendas e amarrar a execução da verba aos seus
interesses, desidratando ainda mais o poder do governo.
Como mostrou a Folha, o Palácio do Planalto busca formas
de manter a influência sobre o destino desses recursos. As conversas caminham
para um aumento no valor reservado para emendas do próximo ano, mas preservando
o poder do governo sobre essa cifra.
Ao se manifestar sobre a própria saída do cargo de
presidente da Caixa (para entregar o comando do banco ao centrão), Rita Serrano
agradeceu a Lula pelo convite para integrar o governo, mas disse nas redes
sociais que é "necessário e urgente pensar em outra forma de fazer
política".
Rita Serrano ainda afirmou que espera deixar como legado
"a mensagem de que é preciso enfrentar a misoginia".
A mudança na Caixa também gerou crítica entre apoiadores
de Lula em movimentos sociais e entidades ligadas a trabalhadores.
"A companheira Rita Serrano vinha fazendo um
excelente trabalho na Caixa. Infelizmente, perdemos um dos maiores instrumentos
de implementação de políticas públicas para o centrão", disse o
coordenador geral da FUP (Federação Única dos Petroleiros), Deyvid Bacelar, nas
redes sociais.
"Precisamos melhorar a nossa correlação de forças no
Congresso Nacional elegendo parlamentares de esquerda, progressistas e
desenvolvimentistas que não deixem governos reféns dessas chantagens",
escreveu Bacelar.
Em nota, a Fenag (Federação Nacional das Associações dos
Gestores da Caixa Econômica Federal) disse lamentar a saída de Rita Serrano. A
entidade disse que ela havia sofrido ataques e "travou uma batalha
ferrenha" no cargo, "mas não resistiu".
A presidente da Contraf-CUT (Confederação Nacional dos
Trabalhadores do Ramo Financeiro), Juvandia Moreira, também criticou a troca no
comando do banco.
"Não vamos aceitar que a política do governo passado
seja implementada na empresa, como o desmonte da empresa e da sua função de
banco público. Nem retrocessos na política da gestão de pessoas", disse
ela, em nota publicada pela entidade.
Apesar de ter criticado a relação do centrão com Jair
Bolsonaro durante a campanha eleitoral, Lula aliou-se ao mesmo grupo e tem
repetido a entrega de cargos e verbas públicas em troca de apoio para votações
no Legislativo.
"Eu não fiz negociação com o centrão, eu não converso
com o centrão, vocês nunca me viram fazer reunião com o centrão. Eu só converso
com partidos políticos que estão aí legalizados, que elegeram bancadas.
Portanto com eles é que eu tenho que conversar, para estabelecer um
acordo", disse Lula na semana passada.
A base do governo no Congresso é frágil. Recentemente, o
Senado chegou a rejeitar a indicação de Igor Roque para o comando da DPU
(Defensoria Pública da União).
Nas horas seguintes à troca na Caixa, porém, a Câmara
destravou a votação da proposta de taxação de offshores e de fundos de
super-ricos.
As mudanças na Caixa e em ministérios para acomodar
aliados do centrão ainda reduziram a presença de mulheres em cargos de primeiro
escalão.
Lula culpou os partidos pela redução da presença feminina
no Executivo. "Quando um partido político tem que indicar uma pessoa e não
tem mulher, eu não posso fazer nada", disse o presidente na última semana.