A pesquisadora Sandra Chaves, coordenadora da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan) na Bahia, afirmou em entrevista à Rádio Metropole que o motivo para a crise da insegurança alimentar no estado e no país não se resume à pandemia da Covid-19.
Seis em cada dez pessoas na Bahia sofrem em algum grau para conseguir se alimentar, segundo dados do Inquérito Nacional Sobre Insegurança Alimentar, da Rede Penssan. A primeira fase da pesquisa apontou que 33 milhões de brasileiros enfrentam a fome.
"Em 2013 nós tínhamos 77% dos domicílios brasileiros em segurança alimentar. Em 2014, o Brasil saiu do famoso Mapa da Fome. Já em 2018, antes da pandemia, tínhamos 63% em segurança, 14% a menos. Isso aconteceu entre 2015 para 2018, com a crise política, econômica e social — reforma trabalhista, suspensão de algumas políticas sociais, redução do benefício (...) A segurança alimentar é extremamente sensível às crises econômicas e sociais. Já vínhamos aumentando [a insegurança] e veio a pandemia que nos pegou em momento frágil", disse em entrevista ao Jornal da Cidade.
Ainda segundo Sandra, desde os primeiros estudos feitos pela rede, em 2004, foi percebido que a renda média da família é um fator preponderante para a insegurança alimentar, além da questão do domicilio ser urbano ou rural, que em domicílios em que a pessoa de referência tem escolaridade baixa aumenta o risco de insegurança, assim como em domicílios que têm desempregados, ou chefiados por mulheres, principalmente quando são negras.
"Um programa de renda mínima seria um sonho. Uma política de Estado e não de governo. O que observamos com a transferência de renda é que nessa sociedade extremamente desigual, a transferência é fundamental. Ela tem que ser persistente e ter um valor também digno", afirma Sandra.
A escala da insegurança alimentar pode apresentar quatro resultados: segurança alimentar, que é quando não há qualquer preocupação de que falte dinheiro para comprar comida e manter o padrão alimentar da família; insegurança alimentar leve, quando o entrevistado diz que tem alguma incerteza sobre a condição de alimentar a família no futuro e isso provoca alguma alteração qualitativa na dieta; insegurança moderada, quando já há alteração quantitativa e qualitativa — mais do que preocupação, há o corte; e insegurança alimentar grave, que é a mais identificada com a fome, quando a família não sabe quando poderá voltar a comer.
"Todas essas situações de insegurança são fragilidades, porque se não tenho mais condições de manter a alimentação tradicional da minha família, eu vou alterar a quantidade, a qualidade ... então vou deixar de comprar uma carne que eu usava, um frango que eu usava... nós vimos as cenas trágicas no país, das pessoas comprando osso para fazer sopa", afirma Sandra.