O Ministério Público da Bahia (MP-BA) endereçou um documento ao Procurador Geral de Justiça (PGJ) em exercício, Paulo Marcelo, para que analise a possibilidade de ingressar com representação ao Procurador Geral da República (PGR), o baiano Augusto Aras, pedindo que seja observada a "flagrante inconstitucionalidade" da Lei Rosemberg, aprovada na Assembleia Legislativa da Bahia em dezembro do ano passado.
O documento é assinado pela promotora Rita Tourinho e pede que o PGJ, caso assim considere, ingresse com uma com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) na PGR, por entender que a lei aprovada na Bahia choca-se com o que está previsto na Constituição Federal do Brasil, de 1988, desobedecendo o dever "de simetria existente entre o TCU e as demais Cortes de Contas".
O documento ainda pontua que "lei estadual não tem o condão de restringir a extensão de norma Constitucional Federal".
Proposta pelo deputado Rosemberg Pinto (PT), e aprovada no dia 22 de dezembro, a lei 14.460 interfere no funcionamento do TCM — órgão especializado na análise das contas públicas dos 417 municípios que compõem o estado. Antes, a aplicação de multas era guiada por critérios como “grave infração à norma legal” e "ato de gestão ilegal, ilegítimo, antieconômico", resultando em "injustificado dano ao erário". A depender da gravidade, as penas variavam entre cinco faixas de valor (de R$ 300 a R$ 15.000).
Com o texto revisado, as penas não podem ser mais aplicadas se não for comprovado que os gestores agiram com "em benefício próprio ou de familiares". Outra restrição imposta é que os conselheiros do TCM precisam demonstrar que houve dolo (intenção) no mau uso do dinheiro — competência que antes cabia ao Ministério Público Estadual (MP-BA), após representação do tribunal, para adoção de medidas cíveis ou criminais.
A lei é inédita em todo o país. Como agravante, ainda choca-se contra preceitos da Constituição Federal (no artigo 75) e, por tabela, cria indisponibilidade com a Constituição do Estado da Bahia (no artigo 91).
Rita Tourinho fez duras críticas ao que chama de "criatividade" do parlamentar. Segundo ela, no documento enviado a Aras, "a interpretação da normanão abre margem para que o legislador infraconstitucional seja criativo e estabeleça restrições a prerrogativa prevista pela Constituição".
Um levantamento exclusivo feito pelo Jornal da Metropole, com base nos arquivos dos últimos cinco anos do órgão, revela um montante de R$ 66 milhões em sanções a prefeitos e secretários por mau uso do dinheiro público. Só no último biênio, de 2020 a 2021, este valor chegou a R$ 31,7 milhões. Neste período, o TCM aplicou um total de 8.040 multas contra gestores que não cumpriram as normas de prestação de contas.