O INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) alertou a
equipe econômica da necessidade de reforçar o orçamento do órgão em mais R$ 3,2
bilhões neste ano para honrar o pagamento de benefícios previdenciários e
compensações devidas a estados e municípios.
Em ofício obtido pela Folha de S.Paulo, o
órgão afirma que o enfrentamento à fila de segurados impulsionou o número de
concessões de benefícios, tornando necessária a ampliação dessa despesa em R$
1,646 bilhão.
O órgão diz ainda que a previsão de gastos
com a compensação previdenciária cresceu R$ 1,595 bilhão, o que também
demandará ajuste no Orçamento. Essa compensação é devida quando um antigo
segurado do INSS acaba se aposentando pelo regime próprio de algum estado ou
município.
As informações constam em nota técnica
produzida pelo INSS para subsidiar o relatório de avaliação de receitas e
despesas do 4º bimestre, que será divulgado na próxima sexta-feira (22).
Segundo interlocutores do governo, embora o
documento tenha sido formalizado na última segunda (18), emissários da
Previdência já haviam relatado à equipe econômica o aumento das despesas com
benefícios na semana passada, o que acendeu um sinal amarelo nos bastidores.
Como se trata de uma despesa obrigatória, o
governo precisa acomodá-la sob os limites de gasto ainda vigentes para 2023 --o
que pode significar novos bloqueios. O governo já precisou travar R$ 3,2
bilhões dos ministérios até julho para evitar o descumprimento de regras
fiscais.
Havia expectativa de que o relatório de
setembro já indicasse a existência de espaço para um desbloqueio de recursos,
mas a surpresa no INSS pode frustrar essa intenção.
Segundo técnicos ouvidos pela reportagem,
algumas reduções em despesas discricionárias ligadas à saúde e na previsão de
despesa com pessoal podem compensar parte do baque vindo da Previdência, mas
talvez não o suficiente para permitir o desbloqueio.
No ofício, o INSS faz alerta de que o quadro
pode se agravar nos próximos meses. Desde o início do ano, o órgão identificou
um crescimento médio de 0,39% ao mês nos valores da folha de pagamento de
benefícios. Segundo os técnicos, trata-se de um "aumento significativo na
média".
O documento salienta que "avaliações
futuras poderão demandar incrementos adicionais na dotação orçamentária, especialmente
se o crescimento vegetativo das despesas previdenciárias se mantiver acima das
projeções atuais".
A maior fonte de combustível para essa
projeção se realizar é o Programa de Enfrentamento à Fila da Previdência
Social, uma promessa de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e
que vem sendo colocada em prática por meio da implementação de um bônus para
servidores do INSS e peritos.
A cada análise extra concluída, eles recebem
R$ 68,00, no caso de avaliação administrativa, ou R$ 75,00, no caso de perícia
médica.
A fila do INSS acumula pelo menos 1,69
milhão de pedidos --o número está sob escrutínio após divergências entre
relatórios revelarem o sumiço de 223 mil requerimentos, como mostrou a Folha de
S.Paulo.
A intenção do ministro da Previdência
Social, Carlos Lupi, é regularizar a situação até o fim do ano, para que não
haja mais pedidos sem resposta há mais de 45 dias.
Para técnicos do governo, a situação
demonstrada no ofício apenas reforça a existência de uma prática que se tornou
recorrente nos últimos anos: a subestimação da despesa com a Previdência Social
no Orçamento.
O ano começou com R$ 835,2 bilhões
reservados para o gasto apenas com benefícios, valor que subirá a R$ 839,9
bilhões após o relatório do 4º bimestre --uma diferença total de R$ 4,7 bilhões.
Para o ano que vem, como mostrou a Folha de
S.Paulo, o governo não considerou eventual redução da fila de espera do INSS e
ainda abateu R$ 12,5 bilhões a serem economizados com revisão de benefícios, em
uma mudança de última hora vista com desconfiança e ceticismo dentro e fora do
governo.
No Comprev, há também sinais preocupantes na
avaliação de interlocutores do governo. Além da necessidade de recursos extras
em 2023, o ofício pede à equipe econômica a liberação com "urgência"
de outro R$ 1,3 bilhão já alocado para essa finalidade, "com um prazo
crítico até 30 de setembro de 2023".
"A maior parte do crédito disponível já
foi utilizada, e o montante restante precisa ser alocado até 30 de outubro de
2023 para garantir a aderência ao princípio da competência e evitar possíveis
encargos decorrentes de atrasos no pagamento. Essa urgência se tornou evidente
devido ao aumento significativo das despesas nas competências mais
recentes", diz o documento.
Além disso, a despesa total da compensação
para 2023 está em R$ 7,3 bilhões --mais do que os R$ 6 bilhões inicialmente
reservados para o ano que vem.
O Comprev acaba configurando um repasse
estratégico para estados e municípios, que têm regimes previdenciários deficitários
e encontram nessas compensações uma importante fonte de receitas.
Cada vez que um antigo segurado do INSS
migra para um regime próprio desses entes, a Previdência Social precisa
repassar a eles as contribuições já recolhidas --isso é o que constitui a
compensação.
O tema, porém, é um alvo histórico de
impasse. Há quase 444 mil processos aguardando análise, feita hoje de forma
manual.
Um processo de automatização está em curso,
mas sua implementação pode pressionar ainda mais as despesas do governo.
Estimativas internas mostram que o gasto do Comprev pode passar de R$ 6 bilhões
para R$ 15 bilhões em 2024.