Foto: Leonardo Milano/ICMBio
Incentivos fiscais dados pelo governo para as
regiões Norte e Nordeste, onde se concentra a Amazônia Legal brasileira,
beneficiaram principalmente atividades com grande potencial de impacto sobre o
meio ambiente.
Estudo do Inesc (Instituto de Estudos
Socioeconômicos) com base em dados da Receita de 2021 mostra que mais da metade
dos valores de renúncia concedidos por Sudam (Superintendência do
Desenvolvimento da Amazônia) e Sudene (Superintendência do Desenvolvimento do
Nordeste) foi direcionada para empresas que atuam em mineração, energia e
petróleo.
"[Os] privilégios fiscais reforçam o padrão de
exploração de recursos naturais concentrados nas regiões Norte e Nordeste, em
especial na Amazônia brasileira", diz o levantamento.
No total, dos R$ 42,3 bilhões em isenção
distribuídos, R$ 22 bilhões (54%) foram direcionados para os três setores. O
levantamento aponta que, de 2010 a 2022, das cinco atividades econômicas mais
contempladas com projetos aprovados pela Sudam, está a infraestrutura (onde
entram projetos de energia e gás), minerais e químicos (que inclui a produção
de petróleo e seus derivados).
Levantamento da reportagem com base em dados da
Receita mostrou que os incentivos fiscais do governo federal beneficiaram 1.112
empresas multadas pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis) entre 2021 e 2022.
Essas companhias receberam um total de mais de R$
84 bilhões em benefícios, enquanto o valor das multas ultrapassa R$ 2 bilhões.
Os incentivos constam da base de dados da Receita de 2021 e incluem programas
como Prouni, Sudam e Pronac, além de benefícios em dispositivos que serão
extintos pela Reforma Tributária em discussão no Congresso, como ICMS, IPI, PIS
e Cofins.
Já as multas são referentes aos valores indicados
no auto de infração. Fazem parte do levantamento as punições que foram pagas e
os casos em que a empresa autuada apresentou recurso. Ficaram de fora penas que
foram anuladas ou nas quais o suposto infrator venceu a causa na Justiça.
O estudo do Inesc usa como base de dados as
informações da Receita, que em 2023 divulgou os valores relativos a 2021, e
dados gerais de projetos aprovados por Sudam e Sudene.
No levantamento, o instituto destaca, por exemplo,
o caso da Vale. A empresa, responsável pelas barragens de Brumadinho e Mariana,
que se romperam em Minas Gerais, recebeu R$ 18 bilhões dos R$ 42 bilhões de
incentivos fiscais em 2021 da Sudam e da Sudene --é a recordista da lista.
A Petrobras é a quinta do ranking de beneficiadas,
com pouco mais de R$ 800 milhões. A Vale e a Petrobras lideram o ranking das
empresas multadas pelo Ibama e que foram beneficiadas com incentivos fiscais,
segundo o levantamento da reportagem.
"As operações da Petrobras na Amazônia
brasileira têm contribuído para o avanço da exploração de petróleo na Foz do
Amazonas, sem garantir a segurança ambiental dos impactos gerados pela
exploração", diz o Inesc.
"Na lista da Receita Federal das empresas
beneficiadas pelos incentivos fiscais pela Sudam e Sudene estão presentes,
ainda, dezenas de empresas do setor do agronegócio e da infraestrutura
associadas ao escoamento de grãos, madeira e carne", completa o estudo.
Dentre as atividades econômicas mais beneficiadas
pela Superintendência do Amazonas, de 2010 a 2022, a que teve mais projetos
aprovados está a de eletrônica e veículos (512), seguida de alimentos e bebidas
(477), químicos (307), minerais (200), infraestrutura (187) e agricultura (72).
PETRÓLEO
Um outro estudo do Inesc analisou os incentivos
fiscais a petroleiras, especificamente do programa Repetro.
Segundo o instituto, oito das dez empresas que mais
se beneficiaram dos R$ 18 bilhões de renúncia relacionada ao IPI (Imposto sobre
Produtos Industrializados) e ao II (Imposto de Importação) são estrangeiras.
Dessas, quatro são dos Estados Unidos, duas do
Reino Unido, uma do Japão e outra da Noruega.
As duas brasileiras são a Petrobras, beneficiada
com a maior parte desta quantia, R$ 13 bilhões, e a Ocyan, a nona colocada com
R$ 151 milhões.
"Além de ampliar a lucratividade
extraordinária da indústria fóssil, os grandes subsídios concedidos ao setor
aceleram a oferta global de petróleo, causando impactos socioambientais e o
aumento exponencial de emissões globais de CO2", destaca o Inesc.
O Repetro também proporcionou isenções de mais de
R$ 14 bilhões com origem no PIS/Cofins, mas os dados não foram analisados pelo
instituto.
A Vale afirmou que as informações sobre isenções
fiscais e investimentos ambientais são públicas, seguindo a política de
transparência da empresa. A companhia diz que, em 2022, recebeu um total de
incentivos de R$ 1,4 bilhão, valor inferior ao de 2021.
"É importante reforçar que a base de cálculo
deste incentivo parte da receita e do lucro contábil da companhia no respectivo
ano fiscal", destaca.
Diz também que a atuação da Vale no mosaico de
Carajás é "exemplo de mineração sustentável". "A Vale reafirma o
seu compromisso com a transparência e a mineração sustentável, promovendo o
desenvolvimento socioeconômico e a conservação das áreas em que atua."
A companhia afirma ter como premissa
"contribuir para o desenvolvimento socioeconômico e estabelecer relações
de respeito e confiança dos territórios nos quais está presente".
A empresa diz que emprega 47 mil pessoas no Pará, e
investiu R$ 29,5 bilhões em 2022, sendo R$ 11,4 bilhões em compras de
fornecedores locais. Também apoia iniciativas na área de cultura, esportes,
entre outras.
A Petrobras preferiu não comentar. As demais
empresas foram procuradas pela reportagem em agosto, mas não responderam.