Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Tornar sigilosos os votos dos ministros do STF
(Supremo Tribunal Federal), como defendeu o presidente Lula nesta terça-feira
(5), não segue os preceitos da Constituição.
O presidente defendeu durante transmissão ao vivo
que os votos não sejam divulgados. Segundo ele, a insatisfação da população com
votações pode gerar insegurança para os magistrados.
"Para a gente não criar animosidade, eu acho
que era preciso começar a pensar se não é o jeito da gente mudar o que está
acontecendo no Brasil. Porque, do jeito que vai, daqui a pouco um ministro da
Suprema Corte não pode mais sair na rua, passear com sua família, sabe, porque
tem um cara que não gostou de uma decisão dele", disse.
"A sociedade não tem que saber como vota um
ministro da Suprema Corte. Não acho que o cara precisa saber, votou a maioria,
não precisa ninguém saber. Porque aí cada um que perde fica com raiva, cada um
que ganha fica feliz, afirmou Lula.
Segundo Raphael Neves, professor de direito
constitucional da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), o regimento
interno do STF prevê a fundamentação publicizada dos votos. "Teria que
haver uma alteração do próprio regimento interno da Corte", afirma.
A publicização também é respaldada por leis que
regulam ações do Supremo e pela própria Constituição, afirma Neves. "Há
uma exigência constitucional de publicização dessas decisões."
Ana Beatriz Presgrave, especialista em direito
constitucional e professora da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do
Norte), aponta que o voto sigiloso não é possível nos moldes atuais do STF.
Segundo ela, embora seja possível discutir se o
modelo de deliberação deva ser público no Brasil, o molde de votação individual
dos ministros não permite o sigilo dos votos.
Juliana Cesario, professora da Faculdade de Direito
da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), afirma que o artigo 93 da
Constituição Federal aponta para a impossibilidade do voto secreto.
Segundo o artigo, julgamentos do Poder Judiciário
devem ser públicos e com decisões fundamentadas, sob pena de nulidade.
"É crucial que a sociedade tenha acesso às
motivações das decisões. É isso que confere legitimidade às decisões do
Judiciário", afirma. "As justificativas das decisões precisam ser
conhecidas para que a sociedade possa entender com base em quê uma decisão foi
tomada."
Para Vera Karam de Chueiri, professora de direito
constitucional da UFPR (Universidade Federal do Paraná), Lula foi infeliz na
declaração.
"Quando o presidente Lula diz que os votos
deveriam ser sigilosos, ele sugere uma forma que não é compatível com o que a
nossa Constituição prescreve. O atual formato constitucional e
infraconstitucional que regulamenta a deliberação do STF não permite que o voto
seja sigiloso".
Lula deu a declaração em um contexto de críticas ao
posicionamento de Cristiano Zanin, indicado por ele para o STF no primeiro
semestre deste ano.
Zanin tem recebido críticas de representantes de
esquerda devido a posicionamentos conservadores. Alguns desses votos foram
contra a descriminalização do porte de drogas para uso pessoal e contra a
tipificação da homotransfobia como crime de injúria racial.