No último dia 28, o Facebook anunciou que o grupo que reúne todas as suas marcas, como WhatsApp, Instagram e a própria rede social Facebook, agora se chama Meta. O nome faz referência ao metaverso que seu fundador, Mark Zuckerberg, deseja construir, uma rede com avatares, acessada por dispositivos de realidade aumentada, que mescla o mundo físico e virtual.
 

O conceito de metaverso não é novo -apareceu primeiro no livro "Snow Crash", de 1992- mas a palavra meta, que deriva do grego, é ainda mais comum, e está presente no nome de várias empresas. Em português, significa, entre outras coisas, o "objetivo que se almeja".
 

A companhia americana Meta PCs, que fabrica computadores, alega que pediu o registro do nome em agosto e que poderia vendê-lo ao Facebook, se este aceitar pagar pelo menos US$ 20 milhões (R$ 111,9 milhões).
 

O caso da Meta dos computadores não é único. No próprio Instagram, o perfil @meta pertence a uma revista sobre motociclismo -restou à Meta do Facebook criar a @wearemeta (nós somos meta).
 

No Brasil há diversas empresas com esse nome, em ramos variados. A maior é a consultoria de transformação digital Meta, fundada em 1990 no Rio Grande do Sul, que tem mais de 2.500 funcionários e está presente em oito países.
 

Quando houve o anúncio da gigante de tecnologia, a Meta brasileira fez postagens com humor no LinkedIn e no Instagram sobre a situação. "Não compramos o Facebook. Ainda não!" diz o texto na rede profissional.
 

Nos comentários, pessoas questionam como fica a questão do uso de marca do negócio. "Acho que o Zuckerberg vai ter alguma dor de cabeça ou talvez faça uma nova aquisição", comentou um dos perfis que reagiram ao texto.
 

Questionada se iria tomar alguma ação a respeito do nome adotado pelo Facebook, a empresa brasileira Meta afirmou que está avaliando e acompanhando o cenário.
 

O mesmo questionamento aparece em reportagens que repercutem o caso da Meta PCs. Há quem ache US$ 20 milhões pouco ou que não se conforme com o deslize do Facebook de não checar a existência de outras empresas com o mesmo nome.
 

Para Genaro Galli, professor de branding da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing), a escolha desse nome foi um tropeço da marca, principalmente por ser uma palavra genérica, que poderia se encaixar em diversos setores.
 

Ele explica que a criação do nome de um negócio parte do processo criativo de profissionais de publicidade, que vão procurar uma palavra que possa ser associada ao produto ou serviço vendido. "O caminho normalmente é criar um nome totalmente novo, um espaço que está em branco para a empresa criar as associações desejadas na mente das pessoas", afirma.
 

Após levantar esses nomes, um passo crucial é consultar, no Brasil, o INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial), para checar se aquela palavra não é usada por outra empresa do mesmo ramo. Só depois disso o nome é apresentado aos gestores do negócio, para aprovação. Fora do país, ou no caso de empresas com atuação global, é preciso consultar os órgãos de cada nação.
 

O mesmo vale para os símbolos que representam uma marca. O símbolo da Meta de Zuckerberg é parecido com um número oito na horizontal, em azul, também entendido como o símbolo do infinito. Duas empresas, a consultoria de comunicação colombiana MileniumGroup e o aplicativo de saúde alemão M-Sense, se pronunciaram na última semana, questionando a similaridade com os símbolos que elas utilizam e afirmando que isso as prejudicaria. Na primeira, o símbolo já foi azul e depois ficou colorido, enquanto na outra é verde.
 

Galli afirma que parte do processo criativo é procurar imagens usadas por negócios do mesmo segmento para ver o que eles utilizam e evitar similaridades.
 

Tudo isso é o caminho tradicional, mas "eles não são ingênuos a ponto de não saber tudo o que estamos falando", pondera o professor. "O poder deles é tão grande que eles vão contra todos esses conceitos e vão sobressair disso tudo", diz. Outras empresas até podem usar o nome meta, mas "Meta agora é Facebook," afirma.
 

De acordo com o advogado Pedro Tinoco, especialista em propriedade intelectual e direito empresarial do escritório Almeida Advogados, caso haja processos judiciais contra a adoção do nome Meta ou do símbolo pelo Facebook, o que empresas desse tamanho costumam fazer é prolongar ao máximo a disputa.
 

A possibilidade de comprar outras empresas que tenham aquele nome e estejam se sentindo lesadas existe, mas não costuma ser o caminho adotado por negócios gigantes, para não abrir precedente. "Quando eles fazem um acordo, normalmente é revestido em uma super cláusula de confidencialidade", diz o advogado.
 

Mas entrar em uma disputa é possível, afirma Tinoco. "Os custos em si não impedem que alguém de médio ou pequeno porte tenha um embate jurídico com o Facebook, o problema é o tempo, as pessoas acabam desistindo, porque o que essas empresas fazem é ficar discutindo para sempre com você".
 

O advogado explica que o primeiro passo ao abrir um negócio, antes mesmo de começar a vender seu serviço ou produto, deveria ser depositar no INPI o pedido de registro da marca. O processo pode levar mais de um ano para terminar, mas a partir de 20 ou 30 dias do depósito, já consta na plataforma do instituto que há um processo em andamento.
 

No Brasil, explica Tinoco, a lei garante a quem fez o primeiro registro o direito de uso da marca. Se ela já existir, então, o empresário corre o risco de ter que mudar de nome, o que pode acarretar danos à imagem do negócio e prejudicar seu desempenho.
 

Não ter o registro da marca, é como "construir um castelo em um terreno que não é seu, o dono chega e você perde tudo", afirma Galli.
 

A Meta nacional fez o depósito do registro em 1996. Até agora, não consta no sistema do INPI o pedido do Facebook para o registro, mas ele pode estar dentro do prazo em que não aparece para visualização.
 

Empresas podem ter o mesmo nome contanto que não atuem no mesmo segmento, e que a existência de uma não prejudique os negócios da outra. Ao registrar o nome no INPI, o empresário escolhe as classes às quais sua empresa pertence. Isso possibilita que, por exemplo, exista o carro Gol e a companhia aérea Gol.
 

"Se toda marca utilizada em algum momento, em algum setor, não puder ser registrada em outra classe, a gama de nomes ficaria limitada", diz o advogado.
 

Essa regra joga a favor de empresas como o Facebook. Por ser muito conhecida, dificilmente um consumidor vai comprar um produto da Meta PCs, por exemplo, pensando ser da nova Meta. Desse modo, o Facebook pode alegar que não há comprometimento da outra marca, mesmo que a categoria de produto seja similar.
 

"Quando algum grande player de um segmento lança uma nova marca, é muito comum algumas empresas de médio e pequeno porte falarem que registraram a marca antes e que querem vendê-la, mas normalmente não tem essa possibilidade de associação indevida", afirma Tinoco.
 

Procurada pela reportagem, a Meta afirmou que não iria se pronunciar.