Iniciada para apurar as ações e omissões do governo federal diante da pandemia, sobretudo no Amazonas, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19 do Senado Federal se estendeu por quase seis meses. Pela televisão, os brasileiros puderam acompanhar ao vivo dezenas de depoimentos, documentos, negociações adversas, além de indícios de crimes, existência de um “gabinete paralelo”, escândalo sobre compras de vacinas, fake news e mais.
Apresentado nesta quinta-feira (20), o relatório final, de mais de mil páginas, aponta o indiciamento de 68 pessoas físicas e empresas, entre elas o presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido). Único baiano titular no colegiado, e que se destacou em diversos momentos, o senador Otto Alencar (PSD) avalia que o documento, o qual será votado na próxima terça-feira (26), tem robustez e consistência e foi essencial para provocar mudança de comportamento do governo federal na aquisição de vacinas, por exemplo.
Após a votação na comissão, as sugestões de indiciamento serão encaminhadas aos órgãos competentes, dentre os quais estão os ministérios públicos estaduais, Polícia Federal e Procuradoria-Geral da União. O senador não vê possibilidade de os esforços empreendidos nos últimos meses ficarem sem resultado efetivo, pois o principal resultado já pode ser observado, neste caso, impor ao governo federal mudança de postura, sobretudo em relação a aquisição de vacinas e avanço da imunização.
“O resultado já teve. Não fosse a CPI, não tinha vacina no braço. O governo federal só foi comprar vacina quando nós iniciamos a CPI, quando conseguimos as assinaturas, no início de março. Ele [Bolsonaro] negou o tempo todo [a vacina], pediu ao Pazuello para não comprar e o Pazuello disse aquela frase: ‘Um manda e outro obedece’”, destaca Otto.
O presidente Jair Bolsonaro, de acordo com o relatório, é denunciado por diversos tipos criminais, a exemplo de crime de responsabilidade, prevaricação, estímulo a pandemia, fake news, ocultação de informações, omissão na compra de vacinas e falsidade ideológica. Apesar do lista extensa, Otto não acredita na possibilidade de o texto reacender na pauta do impeachment na Câmara dos Deputados. A avaliação do senador está baseada na aliança existente entre Bolsonaro e presidente da Câmara, Arthur Lira (PP).
De acordo com Otto, o trabalho realizado pelos senadores foi “intenso e muito difícil” no início. “Enfrentamos a estrutura do governo que a todo momento tentou impedir o andamento e as informações. Alguns momentos pedimos informações ao Ministério da Saúde e nunca mandou. Veio mandar hoje. Eles ocultaram informações, dificultaram repasse de informações. Isso nos deixou no início com muita dificuldade, depois começamos a engrenar, fomos identificando os crimes todos contra a vida das pessoas”, relembra.
GANHO POLÍTICO
A participação do senador baiano na CPI da Covid-19 ganhou notoriedade em diversos momentos, gerando consequências políticas positivas para 2022. Presidente estadual do PSD, um dos mais importantes partidos da base de sustentação do governo Rui Costa (PT), o ganho de visibilidade no colegiado deve fortalecer sua recondução ao Senado.
Em maio, ânimos se acirraram entre os senadores Otto Alencar e Eduardo Girão (Podemos-CE), defensor do governo Bolsonaro. Eles trocaram acusações e ofensas. Os xingamentos trocados entre eles passaram por “mentiroso” e “charlatão”.
A discussão começou quando Otto fez uma correção sobre dados da vacinação apresentados pelo senador Girão durante uma pergunta feita ao ex-ministro Ernesto Araújo, em que sugeriu que o Brasil estaria entre os países com mais vacinados no mundo. Otto, por sua vez, rebateu o colega e apresentou o dado de que 47% dos idosos do Brasil ainda não tinham tomado a 2ª dose da vacina contra a Covid-19 e que, ao considerar as pessoas com esquema vacinal completo (com duas doses), o país somava menos de 10% da população (reveja).
Dois dias após, já com o ministro Eduardo Pazuello, Otto disparou “não sabe nada” e “não deveria ser ministro”. Durante a passagem do então ministro pela CPI, o senador baiano fez perguntas técnicas sobre o coronavírus, as quais o ministro teve dificuldade em responder (reveja).
Em outro momento, já no mês de junho, a imagem de Otto foi projetada a partir da passagem da médica Nise Yamaguchi, defensora do uso da cloroquina, medicamento comprovadamente ineficaz no tratamento da Covid-19. O senador questionou a médica sobre termos técnicos, bem como o relatório apresentado por ela (reveja).